segunda-feira, 2 de abril de 2012

AZAWAD – A AREIA E A FÚRIA – II




Martinho Júnior, Luanda

4 – Apesar de não haverem evidências de ligações dos toubus aos tuaregues, o racismo cultivado na Líbia contra os negros por parte de quem tomou o poder, sob a alegação que eles são todos “mercenários de Kadafi”, pode acabar por unir as populações dispersas em todo o Sahara e Sahel, tendo em conta os relacionamentos que efectivamente Kadafi cultivou com os países a sul da Líbia, nessa imensa região e na África do Oeste.

O governo do Níger por exemplo, não aceitou o pedido das novas autoridades líbias para entregar um dos filhos de Kadafi refugiado no país, em Agadez, onde se encontram militares de alguns dos batalhões líbios que abandonaram Bani Walid (“Large Libyan convoy arrives in Níger” – http://english.aljazeera.net/news/africa/2011/09/20119622012794420.html; “Líbia quer extradição de filho de Kadafi; Níger recusa” – http://br.reuters.com/article/worldNews/idBRSPE81A02E20120211).

O efeito da situação da Líbia durante toda a fermentação de 2011, impulsionou os tuaregues, que no norte do Mali estão em efervescência, não mais com pouco poder militar, mas com as armas e bagagens que trouxeram da Líbia, dum arsenal que pode não só ser proveniente do espólio do Exército Líbia ao serviço de Kadafi, mas de outros, inclusive de grupos fundamentalistas ligados à Al Qaeda, que por seu turno podem estar a ser manipulados por inteligências ao nível do que nos tem vindo a habituar os Estados Unidos!

O “Movimento Nacional de Libertação do Azawad” (“Tuaregs fight for Azawd independence” – http://english.ruvr.ru/2012_03_31/70248383/) está a demonstrar melhor organização, comando e enquadramento que as rebeliões tuaregues anteriores, a ponto de tomar cada vez mais posições no norte e de levar as derrotadas tropas malianas ao efeito boomerang do golpe de estado militar no Mali, outra ratoeira para África, que contribui para os interesses ocidentais e suas tão múltiplas quão “versáteis” manobras de ingerência e manipulação: “jogos africanos”, já se vê!

5 – Os militares do Mali estão a ser derrotados no norte do seu país, precisamente no território reclamado para a independência dos tuaregues, o Azawad.

Cairam nas mãos do “Movimento Nacional de Libertação de Azawad” as capitais regionais de Kidal e, logo a seguir, Gao e, no dia 1 de Abril, a milenar Tombuctu.

A aparente apatia do governo do Presidente Amadou Toumani Touré (http://en.wikipedia.org/wiki/Amadou_Toumani_Tour%C3%A9) pode-se definir em várias factores que se voltaram internamente contra si, por exemplo:

- Foi incapaz de avaliar as repercussões no seu território dos riscos provocados pela rebelião dos tuaregues, em função da evolução das transformações na Líbia: se antes eram riscos de “relativamente baixa intensidade”, o acesso a arsenais militares importantes e as recentes experiências em combate permitia-lhes uma organização e um potencial que nunca antes haviam conseguido (“La crisis líbia impulsiona la ofensiva tuareg contra el Gobierno de Mali” – http://www.gara.net/paperezkoa/20120119/316422/es/La-crisis-libia-impulsa-ofensiva-tuareg-contra-Gobierno-Mali);

- Esqueceu compromissos antigos com os tuaregues, tornando-se displicente em relação às próprias Forças Armadas, conforme se pode constatr numa análise bastante fundamentada (“The causes of the uprising in Northern Mali” – http://thinkafricapress.com/mali/causes-uprising-northern-mali-tuareg);

- Foi incapaz de reforçar a tempo e horas o poderio militar das suas guarnições a norte, ao nível das ameaças que se incrementaram a partir sobretudo da segunda metade de 2011 e quando o fez limitou-se ao esforço militar sem fazer uso de outras medidas (“Caos no Sahara” – http://sol.sapo.pt/inicio/Internacional/Interior.aspx?content_id=45593);

- Não se preveniu, por influência das políticas neo liberais que consomem o continente, do facto das forças militares do Mali reagirem com um golpe militar em Bamako, em função da derrota militar do Exército do Mali no norte (Kidal, Gao e Tombuctu), apesar do Presidente ser um militar; neste aspecto veja-se quão irrisória foi a “ajuda” norte americana, feita por via da sua Embaixada em Bamako EM Outubro de 2009 e à margem do AFRICOM ( “U.S. Government Provides Equipment to Malian Army” – http://www.africom.mil/getArticle.asp?art=3601&blog=all).

Os aliados do governo do Mali, Estados Unidos e França incluídos, poderiam previamente informar o Presidente Amadou Toumani Touré dos movimentos hostis que os tuaregues faziam no Sahara / Sahel, mas como a sua pretensão no quadro das políticas neo liberais é cada vez mais enfraquecer os africanos à custa de regionalismos e divisões, redesenhando assim o mapa do continente, preferiram aguardar a evolução dos acontecimentos, até por que desse modo obtinham acrescidas garantias de aumento de capacidades nas suas ingerências e manipulações em todos as dinâmicas do seu relacionamento: político, económico, financeiro, social, militar e de inteligência, conforme aliás ao carácter das estruturas, no caso norte americano, do AFRICOM.

6 – O golpe militar ocorreu a 21 de Março de 2012 em Bamako (“2012 malian coup d’état” – http://en.wikipedia.org/wiki/2012_Malian_coup_d'%C3%A9tat) e o Presidente aparentemente estará em parte incerta, podendo a sua localização ser conhecida por parte da inteligência francesa (“French ambassador to Mali reassured after talking to ousted President Touré” – http://www.english.rfi.fr/africa/20120327-french-ambassador-mali-reassured-after-talking-ousted-president-toure).

Enquanto isso acontece o MNLA está rapidamente a tomar todo o norte.

Todos os africanos pouco a pouco vão reagindo condenando os golpistas, alinhando assim com a condenação norte americana, europeia, francesa, russa, chinesa e internacional.

As organizações regionais da África Ocidental, CEDEAO e ECOWAS, são unânimes não só em condenar o golpe, mas em reagir procurando assumir o controlo da situação, incluindo em resposta à bem sucedida ofensiva-relâmpago do “Movimento Nacional de Libertação do Azawad” no norte.

O Mali está sob sanções rigorosas, sem governo, com os militares golpistas completamente isolados e com a rebelião tuaregue do MNLA senhora da situação no norte.

Os africanos condenando o golpe e isolando os golpistas, estão sem opções para fazer frente aos tuaregues, que podem a partir do fulcro Azawad procurar estabelecer um precedente que será difícil de tornear.

Qualquer que seja a reacção africana e regional, a situação favorece tacitamente os interesses do império e de suas políticas neo liberais: uma vez mais dividir, dividir e dividir… para melhor reinar!

O neo colonialismo em época de capitalismo neo liberal está a ser imposto pouco a pouco a toda a África, à custa do redesenhar do mapa sócio-político do continente e a África, onde a unidade é a maior das utopias, continua a comportar-se como “aquele corpo inerte onde cada abutre vem depenicar o seu pedaço”!

Foto: O Presidente maliano em visita ao Presidente George W. Bush; a cerimónia faz parte dos “jogos africanos”: “dar as cartas e baralhar de novo”.


2 comentários:

Anónimo disse...

Os Toubus líbios desmascaram a hipocrisia dos líderes africanos!
29 de Março de 2012
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Sabha está quente. As tribos líbias que habitam no sul do país recusam-se a aceitar a autoridade árabe salafista que ocupa Trípoli, decidindo recorrer ao uso de armas de fogo e lutar contra as forças apoiadas por Obama, Cameron e Sarkozy, as quais têm praticado actos de genocídio especialmente destinados a exterminar a população negra da nação do Norte de África.
O silêncio por parte da chamada "Comunidade Internacional" acerca dos actos de barbaridade que se têm testemunhado na Líbia, contra as populações negras e árabes que contestam a ocupação imperialista e o controle wahhabista do seu país, é um testemunho de que o povo africano jamais poderá depender de qualquer apoio externo nesta luta contra a usurpação das riquezas do continente e contra a constante degradação e humilhação dos seus valores humanos.
Mas, o que se torna ainda mais óbvio, é a necessidade de recorrer-se à uma profunda análise sobre o comportamento da liderança africana, caso haja alguma digna deste atributo, face ao desempenho da sua atitude em aceitar de olhos fechados e com bocas silenciosas, aquilo que é sem sombra de dúvidas, um dos maiores crimes que o continente observa contra o seu povo nos tempos modernos. Esta passividade deve ser encarada e confrontada de uma forma eficaz, e o povo líbio na sua generalidade, tem demonstrado uma coragem enorme, em utilizar todos os mecanismos possíveis para defender todos os seus valores e dignidade, algo que os fantoches ao serviço dos poderes ocidentais, estão sempre prontos a oferecer, em troca de migalhas colhidas no fundo das mesas de banquete dos seus mestres.

...

http://kimbozeiro.blogs.sapo.ao/84118.html

Anónimo disse...

Dezenas de mortos em confrontos tribais

Tripoli - Dezenas de pessoas morreram em confrontos entre os toubus e outras tribos em Sabha, uma cidade do sul da Líbia onde a situação se tornou incontrolável.
"Hoje (terça-feira) o registro é de 15 mortos e 63 feridos", declarou Abdelrahman Arich, acrescentando que na segunda-feira morreram 16 pessoas e 60 ficaram feridas nas tribos da cidade de Sabha, que combatem membros armados da tribo dos toubus.
O chefe dos toubus, Isa Abdelmajid Mansur, informou que 40 pessoas morreram na sua tribo e acusou as autoridades líbias de usar aviões militares e tanques para bombardear posições ao sul de Sabha.
Abdelrahman Seif al-Nasr, chefe do comité de segurança da região de Fezán (Sul), confirmou à AFP que aviões bombardearam uma coluna de veículos que se dirigia para Sabha partindo de Qatrun, próximo à fronteira com o Níger e Tchad, depois desses "aviões de reconhecimento" terem sido alvo de disparos de canhões anti - aéreos.

O representante de Sabha no Conselho Nacional de Transição (CNT, no poder) declarou a um canal de televisão líbio que se demitia do seu cargo para denunciar "a passividade" do governo e sua "incapacidade de reagir".

Já o chefe dos toubus acusou ex -rebeldes de terem atacado sua tribo com o apoio do CNT. Também denunciou, em declarações à AFP, um plano de "limpeza étnica" contra sua tribo e ameaçou pedir a independência.

"Anunciamos a reactivação da Frente Toubu para a Salvação da Líbia (FTSL, movimento opositor no antigo regime) para proteger os toubus de uma limpeza étnica e, se preciso, pediremos uma intervenção internacional e trabalharemos por um Estado como o Sudão do Sul", que se tornou independente em Julho, declarou.
Os toubus, de raça negra, vivem entre a Líbia, o norte do Chade e Níger. Eles estão envolvidos desde Fevereiro em choques sangrentos com tribos locais do sul do país.



http://www.portalangop.co.ao/motix/pt_pt/noticias/africa/2012/2/13/Dezenas-mortos-confrontos-tribais,e34dbfe6-bb8f-40d5-b6bb-9ccda72033a4.html

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