quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Portugal: A GROSSEIRA INCONSTITUCIONALIDADE DA TRIBUTAÇÃO SOBRE PENSÕES

 


António Bagão Félix – Público, opinião
 
Aprovado o OE 2013, Portugal arrisca-se a entrar no "Guinness Fiscal" por força de um muito provavelmente caso único no planeta: a partir de um certo valor (1350 euros mensais), os pensionistas vão passar a pagar mais impostos do que outro qualquer tipo de rendimento, incluindo o de um salário de igual montante! Um atropelo fiscal inconstitucional, pois que o imposto pessoal é progressivo em função dos rendimentos do agregado familiar [art.º 104.º da CRP], mas não em função da situação activa ou inactiva do sujeito passivo e uma grosseira violação do princípio da igualdade [art.º 13.º da CRP].
 
Por exemplo, um reformado com uma pensão mensal de 2200 euros pagará mais 1045 € de impostos do que se estivesse a trabalhar com igual salário (já agora, em termos comparativos com 2009, este pensionista viu aumentado em 90% o montante dos seus impostos e taxas!).

Tudo isto por causa de uma falaciosamente denominada "contribuição extraordinária de solidariedade" (CES), que começa em 3,5% e pode chegar aos 50%. Um tributo que incidirá exclusivamente sobre as pensões. Da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações. Públicas e privadas. Obrigatórias ou resultantes de poupanças voluntárias. De base contributiva ou não, tratando-se por igual as que resultam de muitos e longos descontos e as que, sem esse esforço contributivo, advêm de bónus ou remunerações indirectas e diferidas.

Nas pensões, o Governo resolveu que tudo o que mexe leva! Indiscriminadamente. Mesmo - como é o caso - que não esteja previsto no memorando da troika.

Esta obsessão pelos reformados assume, nalguns casos, situações grotescas, para não lhes chamar outra coisa. Por exemplo, há poucos anos, a Segurança Social disponibilizou a oferta dos chamados "certificados de reforma" que dão origem a pensões complementares públicas para quem livremente tenha optado por descontar mais 2% ou 4% do seu salário. Com a CES, o Governo decide fazer incidir mais impostos sobre esta poupança do que sobre outra qualquer opção de aforro que as pessoas pudessem fazer com o mesmo valor... Ou seja, o Estado incentiva a procura de um regime público de capitalização (sublinho, público) e logo a seguir dá-lhe o golpe mortal. Noutros casos, trata-se - não há outra maneira de o dizer - de um desvio de fundos através de uma lei: refiro-me às prestações que resultam de planos de pensões contributivos em que já estão actuarialmente assegurados os activos que caucionam as responsabilidades com os beneficiários. Neste caso, o que se está a tributar é um valor que já pertence ao beneficiário, embora este o esteja a receber diferidamente ao longo da sua vida restante. Ora, o que vai acontecer é o desplante legal de parte desses valores serem transferidos (desviados), através da dita CES, para a Caixa Geral de Aposentações ou para o Instituto de Gestão Financeira da S. Social! O curioso é que, nos planos de pensões com a opção pelo pagamento da totalidade do montante capitalizado em vez de uma renda ou pensão ao longo do tempo, quem resolveu confiar recebendo prudente e mensalmente o valor a que tem direito verá a sua escolha ser penalizada. Um castigo acrescido para quem poupa.

Haverá casos em que a soma de todos os tributos numa cascata sem decoro (IRS com novos escalões, sobretaxa de 3,5%, taxa adicional de solidariedade de 2,5% em IRS, contribuição extraordinária de solidariedade (CES), suspensão de 9/10 de um dos subsídios que começa gradualmente por ser aplicado a partir de 600 euros de pensão mensal!) poderá representar uma taxa marginal de impostos de cerca de 80%! Um cataclismo tributário que só atinge reformados e não rendimentos de trabalho, de capital ou de outra qualquer natureza! Sendo confiscatório, é também claramente inconstitucional. Aliás, a própria CES não é uma contribuição. É pura e simplesmente um imposto. Chamar-lhe contribuição é um ardil mentiroso. Uma contribuição ou taxa pressupõe uma contrapartida, tem uma natureza sinalagmática ou comutativa. Por isso, está ferida de uma outra inconstitucionalidade. É que o já citado art.º 104.º da CRP diz que o imposto sobre o rendimento pessoal é único.
 
Estranhamente, os partidos e as forças sindicais secundarizaram ou omitiram esta situação de flagrante iniquidade. Por um lado, porque acham que lhes fica mal defender reformados ou pensionistas desde que as suas pensões (ainda que contributivas) ultrapassem o limiar da pobreza. Por outro, porque tem a ver com pessoas que já não fazem greves, não agitam os media, não têm lobbies organizados.

Pela mesma lógica, quando se fala em redução da despesa pública há uma concentração da discussão sempre em torno da sustentabilidade do Estado social (como se tudo o resto fosse auto-sustentável...). Porque, afinal, os seus beneficiários são os velhos, os desempregados, os doentes, os pobres, os inválidos, os deficientes... os que não têm voz nem fazem grandiosas manifestações. E porque aqui não há embaraços ou condicionantes como há com parcerias público-privadas, escritórios de advogados, banqueiros, grupos de pressão, estivadores. É fácil ser corajoso com quem não se pode defender.

Foi lamentável que os deputados da maioria (na qual votei) tenham deixado passar normas fiscais deste jaez mais próprias de um socialismo fiscal absoluto e produto de obsessão fundamentalista, insensibilidade, descontextualização social e estrita visão de curto prazo do ministro das Finanças. E pena é que também o ministro da Segurança Social não tenha dito uma palavra sobre tudo isto, permitindo a consagração de uma medida que prejudica seriamente uma visão estratégica para o futuro da Segurança Social. Quem vai a partir de agora acreditar na bondade de regimes complementares ou da introdução do "plafonamento", depois de ter sido ferida de morte a confiança como sua base indissociável? Confiança que agora é violada grosseiramente por ditames fiscais aos ziguezagues sem consistência, alterando pelo abuso do poder as regras de jogo e defraudando irreversivelmente expectativas legitimamente construídas com esforço e renúncia ao consumo.
 
Depois da abortada tentativa de destruir o contributivismo com o aumento da TSU em 7%, eis nova tentativa de o fazer por via desta nova avalanche fiscal. E logo agora, num tempo em que o Governo diz querer "refundar" o Estado Social, certamente pensando (?) numa cultura previdencial de partilha de riscos que complemente a protecção pública. Não há rumo, tudo é medido pela única bitola de mais e mais impostos de um Estado insaciável.

Há ainda outro efeito colateral que não pode ser ignorado, antes deve ser prevenido: é que foram oferecidos poderosos argumentos para "legitimar" a evasão contributiva no financiamento das pensões. "Afinal, contribuir para quê?", dirão os mais afoitos e atentos.

Este é mais um resultado de uma política de receitas "custe o que custar" e não de uma política fiscal com pés e cabeça. Um abuso de poder sobre pessoas quase tratadas como párias e que, na sua larga maioria, já não têm qualquer possibilidade de reverter a situação. Uma vergonha imprópria de um Estado de Direito. Um grosseiro conjunto de inconstitucionalidades que pode e deve ser endereçado ao Tribunal Constitucional.

PS1: Com a antecipação em "cima da hora" da passagem da idade de aposentação dos 64 para os 65 anos na função pública já em 2013 (até agora prevista para 2014), o Governo evidencia uma enorme falta de respeito pela vida das pessoas. Basta imaginar alguém que completa 64 anos em Janeiro do próximo ano e que preparou a sua vida pessoal e familiar para se aposentar nessa altura. No dia 31 de Dezembro, o Estado, através do OE, vai dizer-lhe que, afinal, não pode aposentar-se. Ou melhor, em alguns casos até poderá fazê-lo, só que com penalização, que é, de facto, o que cinicamente se pretende com a alteração da lei. Uma esperteza que fica mal a um Governo que se quer dar ao respeito.

PS2: Noutro ponto, não posso deixar de relevar uma anedota fiscal para 2013: uma larga maioria das famílias da classe média tornadas fiscalmente ricas pelos novos escalões do IRS não poderá deduzir um cêntimo que seja de despesas com saúde (que não escolhem, evidentemente). Mas, por estimada consideração fiscal, poderão deduzir uns míseros euros pelo IVA relativo à saúde... dos seus automóveis pago às oficinas e à saúde... capilar nos cabeleireiros. É comovente...
 

MERCADOS: OS MONSTROS DE NOSSO TEMPO – Mário Soares

 


Mário Soares, Lisboa – Opera Mundi
 
Classe política europeia precisa mudar seu modelo político e tomar as rédeas da economia
 
A União Europeia vive uma das situações mais difíceis desde sua criação, em 1957, com a assinatura do Tratado de Roma. A economia especulativa, engendrada pelo neoliberalismo, exerce o controle da política por meio dos monstros sagrados de nosso tempo: os mercados.

Em função dos interesses do momento, os mercados obrigam os Estados a se submeterem à sua vontade, por meio dos conglomerados financeiros que os controlam, com a ajuda das agências qualificadoras de risco.

Estas agências emitem julgamentos sobre a solvência dos Estados e das empresas, não em função de avaliações objetivas, mas de acordo com os interesses variáveis de seus principais clientes, precisamente os senhores das finanças.

A intolerável dependência da política em relação à especulação financeira e não à relação contrária, como foi no passado, bem como a aliança entre certos líderes políticos e determinados capitalistas, e o consequente declínio dos valores éticos, desembocaram na crise global que paralisa a União Europeia, está levando seus países-membros à ruína e faz temer que o bloco possa se desintegrar.

Esta situação aflige todos os Estados-membros da UE, embora em graus diferentes, e em particular os países da zona do euro. No entanto, também o Reino Unido, que não aderiu ao euro, enfrenta um quadro econômico de extrema gravidade.

Portanto, compreende-se que esta involução esteja afastando, cada dia mais, os povos de seus respectivos líderes.
 
É curioso comprovar a aceleração das mudanças em nossos tempos. Em apenas 20 anos, assistimos ao declínio das duas grandes ideologias contrárias que marcaram o século XX: comunismo e neoliberalismo.

Para que seja possível emergir o novo paradigma, deve acontecer uma revolução, que espero seja pacífica, que restabeleça a primazia da política sobre a economia e a vigência de valores éticos rígidos.

No plano econômico, devem ser restaurados as regras e o controle sobre os mercados e eliminados os paraísos fiscais, as economias virtuais, as agências qualificadoras de risco e todas as modalidades que facilitaram a hegemonia do capitalismo especulativo e nos arrastaram à crise atual.

Uma premissa é o aprofundamento da democracia em nossos países. Devemos ser mais liberais, não no sentido econômico, mas no político e também no social, pois estes são valores fundamentais da identidade errônea. A inversão do ideário liberal é um dos equívocos fomentados pelo neoliberalismo.

Outro conceito que deve ser esclarecido é o da identidade política. Tradicionalmente, e até os nossos dias, as duas grandes correntes ideológico-partidárias do velho continente são a democracia cristã e o socialismo democrático.

Entretanto, embora continuem se chamando socialistas ou democratas-cristãos, a grande maioria dos governantes dos países europeus é ultraconservadora. Na verdade, hoje escasseiam os políticos que podem ser considerados autênticos socialistas ou democratas-cristãos.

Do meu ponto de vista, isto é o que explica que os líderes europeus, quando participam de reuniões de cúpula da UE, não tenham coragem nem a vontade política de modificar o modelo econômico.

A reforma do modelo, mesmo parcial, implicaria necessariamente afetar certos interesses e fazer perigar a conivência malsã entre a política e os negócios, que está ligada ao financiamento dos partidos políticos. A consequência desta trama de interesses é a paralisia das instituições europeias e dos Estados-membros da UE.

Estamos, portanto, em uma encruzilhada. Ou a União Europeia executa as reformas que agora requer e voltamos a ser um farol de esperança em um mundo cada vez mais interdependente e que reclama uma nova ordem, ou, tal como adverte uma análise do comitê de sábios presidido por Felipe González, nos encaminharemos para uma triste e inevitável decadência.

(*) Mário Soares é ex-presidente e ex-primeiro-ministro de Portugal. Texto para a IPS publicado no site Envolverde.
 
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UE-Médio Oriente: A EUROPA É UM MERO ESPETADOR

 


El País, Madrid – Presseurop – imagem AFP
 
Incapazes, mais uma vez, de adotarem uma posição comum sobre uma questão de política externa, os países europeus deverão votar de maneiras diferentes na ONU sobre o estatuto de Estado observador para a Palestina. No entanto, já houve tempos em que os europeus pretenderam ter um papel essencial a desempenhar no processo de paz.
 
 
Já é assunto aceite com resignação que a União Europeia não tem política externa. São normais os sarcasmos sobre Lady Ashton, a vice-presidente da Comissão e Alta representante para a Política Externa, a quem se incumbiu o encargo de comandar um barco sem rumo, sem velas e talvez mesmo sem casco, ou seja, um artefacto que nem sequer serve para navegar.
 
Desde julho de 2010 que comanda um fantástico Serviço Europeu para a Ação Externa, com três mil diplomatas de altíssimo nível profissional que, na verdade, não têm a quem servir, porque lhe falta a unidade e a vontade políticas que conformam uma identidade e uma personalidade internacionais.
 
Hoje, uma vez mais, teremos oportunidade de contemplar o espetáculo da Europa evanescente, quando a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovar a petição que o presidente da Autoridade Palestiniana vai apresentar, para que o plenário da primeira instituição internacional reconheça à Palestina o papel de Estado observador, mas não de membro. Fracassaram, como se esperava, todas as tentativas para chegar a uma posição comum, que deveria contar com o voto de todos os vinte e sete membros da UE e por isso começou o desfile de governos que decidiram ir por outros caminhos.
 
Política externa quando esta nem sequer existia
 
Agora parece normal. A luta europeia pelo dinheiro é tão diária, os agravos e desconsiderações mútuos tão habituais e a desafetação do projeto comum tão extensa que é fácil esquecer que as coisas nem sempre foram assim. A verdade brutal que é preciso esfregar na cara dos atuais líderes políticos é que os europeus tinham política externa quando não existia política externa.
 
A que há que acrescentar outra ainda mais cruel: o pouco que foi possível avançar no caminho da paz entre israelitas e palestinianos deve-se às decisões e resoluções tomadas quando nós, europeus, tínhamos, quase sem o sabermos, uma personalidade e uma política externas.
 
A prova contra o vazio de hoje é a Declaração de Veneza, um documento de junho de 1980, em resposta aos Acordos de Camp David e à assinatura do Tratado de Paz entre o Egito e Israel, em que os chefes de Estado e de governo dos nove países-membros da Comunidade Europeia, hoje UE, se comprometiam a desempenhar “um papel especial” na obtenção da paz na região; reconheciam o direito dos palestinianos à autodeterminação; prefiguravam já os dois Estados, o atual Israel e um outro para os palestinianos, convivendo em paz e segurança e reconhecidos por todos; e defendiam a via das negociações entre as duas partes. Já nesse tempo longínquo os nove condenavam a política de ocupações, que classificavam como “sério obstáculo para o processo de paz” e condenavam a alteração unilateral do estatuto de Jerusalém. E tudo isso por unanimidade. Sem um único veto.
 
Uma ideia de futuro
 
Na manhã de 28 de novembro apenas quatro desses nove signatários da declaração tinham garantido um voto afirmativo para a Palestina: França, Dinamarca, Luxemburgo e Irlanda. A Bélgica quase de certeza acabará por também dizer sim. O Reino Unido com as suas condições, a Alemanha com as suas dúvidas e reflexões e a Holanda e a Itália com a sua posição contra compõem o quadro da desunião europeia em relação à época em que a Europa tinha uma política externa.
 
A votação de hoje será uma demonstração de debilidade e de ausência da UE, enquanto tal, na cena internacional, no momento em que os emergentes, no seio dos quais a causa palestiniana tem maior apoio, estão a irromper. A ideia de um Estado palestiniano, por muito impossível e utópica, está carregada de futuro se observarmos duas coisas muito simples e que são os carris sobre os quais corre a história: a demografia da região e o mapa geopolítico do mundo.
 
Traduzido do castelhano por Maria João Vieira
 
Contraponto
 
UE não deve compactuar com o erro dos palestinianos
 
A votação da ONU pode elevar, no papel, o estatuto do governo palestiniano a Estado-observador, mas não irá alterar a realidade que se vive no país”, escreve Daniel Schwammenthal em The Commentator. Segundo o diretor do American Jewish Committee do Transatlantic Institute em Bruxelas, “nenhum país da UE deveria compactuar” com o agravamento do “erro” palestiniano de 1947, quando estes rejeitaram a partição da Palestina, como foi proposto pela resolução da ONU de 29 de novembro que apelou a um Estado Palestiniano e Judeu. Schwammenthal acrescenta que
 
a criação de um Estado apenas pode resultar de negociações diretas e qualquer aprovação da ONU baseada nos termos palestinianos apenas fará com que no futuro seja mais difícil chegar a um acordo mútuo aceitável. Desta forma, a proposta da ONU ameaça separar a criação de um Estado Palestiniano do principal objetivo de instaurar a paz no país.
 
O único quadro jurídico válido entre Israel e a Palestina – os “Acordos de Oslo” de 1995 – proíbe especificamente o tipo de manobra unilateral planeada por Abbas.
 
Ao apoiar esta proposta unilateral da ONU, os Estados-membros da UE não só estariam a ajudar os palestinianos a violar as suas obrigações contratuais, como também a debilitar a própria posição da UE, que serviu de testemunha nos Acordos de Oslo.
 
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ONG questiona preços, remédios e publicidade de grupos farmacêuticos no Brasil

 

 
Boehringer Ingelheim comercializa no Brasil o Buscopan Composto, proibido em outros países. Bayer vende caro um importante medicamento contra o câncer. E também a Baxter é criticada pela sua política de preços.
 
O estudo Às custas dos pobres, realizado pela ONG alemã Bundeskoordination Internationalismus (Buko), pesquisou no Brasil a conduta de três multinacionais da indústria farmacêutica: as alemãs Bayer HealthCare e Boehringer Ingelheim e a norte-americana Baxter.
 
Entre janeiro de 2011 e junho de 2012 foram avaliadas a oferta de medicamentos, a política de preços e as estratégias de marketing dos três grupos. Apesar de alguns pontos positivos, como o fato de muitos medicamentos importantes produzidos pelas multinacionais serem comercializados no Brasil, as críticas se sobressaem: preços muito altos impedem o acesso a medicamentos importantes, remédios proibidos em outros países são vendidos no Brasil, algumas campanhas publicitárias são enganosas e combinações de substâncias oferecem riscos à saúde.
 
"O objetivo era identificar problemas nas estratégias dessas empresas e tentar mudar algumas de suas condutas", fala o pesquisador Rogério Hoefler, do Conselho Federal de Farmácia, que cooperou com o projeto da ONG alemã. "Para produtos que as empresas não podem comercializar na Alemanha, elas procuram um outro mercado e utilizam a fragilidade desses países na questão sanitária", completa o pesquisador. E o Brasil é um desses destinos.
 
Na avaliação de Hoefler, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) – que existe há pouco mais de dez anos – ainda encontra-se em seus primórdios em termos de atuação. Segundo o pesquisador, as empresas tiram proveito dessa situação. "Mesmo sabendo que o produto não seria adequado e seguro para ser comercializado, elas vão vendendo enquanto o governo permite", afirma.
 
Buscopan Composto
 
Essa declaração vale, por exemplo, para a Boehringer Ingelheim. O Buscopan Composto, por exemplo, é severamente criticado por conter a substância ativa metamizol, que pode desencadear diversas reações adversas no corpo, além de provocar uma redução drástica de glóbulos brancos, importantes para o sistema imunológico.
 
A substância é proibida nos EUA, no Reino Unido, na Austrália, no Canadá e na Suécia. Na Alemanha, os medicamentos que contêm metamizol foram retirados do mercado em 1990 e o uso da substância é limitado a determinados casos.
 
A pesquisa afirma que a Boehringer Ingelheim continua oferecendo o medicamento nas farmácias brasileiras por interesses econômicos: o Buscopan Composto é o medicamento mais vendido no país, tendo sido responsável por 11% do faturamento da Boehringer Ingelheim no Brasil em 2011.
 
Preços elevados e publicidade enganosa
 
Já a Bayer HealthCare, sediada em Leverkusen, no oeste alemão, é criticada por suas peças publicitárias e seus altos preços. O medicamento Nexavar, muito importante no tratamento do câncer de fígado, custa no Brasil por mês para cada paciente um total de 2.934 euros (aproximadamente 7.300 reais) – um preço salgado até para a classe mais abastada, ressalta a pesquisa.
 
Além disso, certas "misturas absurdas de vitaminas" também foram criticadas. O complexo Supradyn Pré-Natal reúne 25 substâncias. Segundo especialistas, isso é problemático, uma vez que a reação do corpo à ingestão concomitante de tantos princípios ativos é imprevisível.
 
Além disso, as peças publicitárias do medicamento são questionáveis: num spot para a TV, mãe e filho tomam juntos um comprimido do composto vitamínico, enquanto degustam uma comida fast food, insinuando ao espectador uma alimentação que fornece energia ao corpo.
 
Sem colaboração
 
A norte-americana Baxter foi a que melhor se saiu nos resultados da pesquisa – mas é, também, a menos presente no mercado brasileiro entre as três empresas pesquisadas. Em 2011, a multinacional comercializou 53 produtos no país, ao passo que a Boehringer Ingelheim esteve presente com 104 medicamentos e a Bayer, com 167.
 
Uma das críticas à Baxter é, contudo, a política de preços. As parcelas mais pobres da população, bem como os hospitais públicos, acabam não tendo acesso aos remédios do fabricante. Além disso, a empresa não se dispôs a colaborar com o estudo e se recusou a responder os questionários enviados.
 
A equipe de pesquisadores tentou entrar em contato com as três multinacionais no Brasil, mas o retorno foi mínimo: apenas a Boehringer Ingelheim respondeu. "Essa falta de transparência é um aspecto muito importante. Percebemos que quase não existe um compromisso com a sociedade, nem uma transparência de informar o que fazem no Brasil", aponta Hoefler.
 
Conclusões finais
 
O estudo conclui que o livre acesso à saúde no Brasil esbarra principalmente nos altos preços dos medicamentos, principalmente no que diz respeito às chamadas "doenças da civilização", como enfermidades cardíacas e circulatórias, câncer ou diabetes, cujo tratamento depende muitas vezes de medicamentos de preços elevado. Para mudar essa situação são necessários investimentos enorme nos próximos anos, concluem os pesquisadores.
 
A pesquisa realizada no Brasil complementa projeto semelhante executado na Índia, em 2010, no qual a conduta das mesmas empresas foi analisada. O estudo será publicado no Brasil, em português, entre fevereiro e março de 2013.
 
O Brasil é o quarto maior mercado consumidor de medicamentos do mundo, depois dos EUA, da Alemanha e da França. Desde 2005, o mercado brasileiro cresce num ritmo acima dos 10%, em 2010 chegou até a 19% ao ano. Além disso, o Brasil é o país com maior número de farmácias do mundo – a Federação Brasileira das Redes Associativistas de Farmácias registra mais de 60 mil drogarias em todo o território nacional.
 
Autora: Christina Weise (sv) - Revisão: Alexandre Schossler
 

Brasil: STF DEU O GOLPE E ASSUMIU O PODER

 


Rui Martins, Berna – Direto da Redação
 
Berna (Suiça) - A mais recente tentativa de golpe pelo STF foi no julgamento do italiano Cesare Battisti, ameaçado de extradição a pedido do governo Berlusconi. Num artigo publicado na época, alertei quanto à tentativa de golpe pelo STF. O objetivo do Supremo, presidido então por Gilmar Mendes, era o retirar do presidente Lula o direito, que lhe era garantido pela Constituição, de decidir se Battisti seria ou não enviado ao governo italiano.
 
Antes disso houve, e o ex-ministro da Justiça, Tarso Genro, denunciou diversas vezes, a inconstitucionalidade da decisão tomada pelo STF, ultrapassando seus poderes, de ignorar a decisão do ministro da Justiça negando expatriar Cesare Battisti. Gilmar Mendes e Peluso tudo fizeram para expatriar Battisti, julgando-se mais competentes na matéria que o Ministério da Justiça e, atingido esse objetivo, queriam se sobrepor ao direito do presidente Lula dar a última palavra. Essa tentativa de somar mais poder e desmoralizar o presidente se frustrou e Lula deu acolha ao italiano, que tinha passado mais de dois anos ilegalmente preso.
 
Porém ficou evidente - o STF era incompetente na questão Battisti, seu longo julgamento deve ser considerado nulo e desnecessário, pois a questão já havia sido resolvida pelo ministro da Justiça. Em todo caso, desrespeitando o princípio constitucional da equiparação dos Poderes, o STF decidiu por maioria de um voto pela extradição de Battisti sem dispor de provas, optando pela versão unilateral do governo italiano. Não me lembro qual foi a posição do ministro Joaquim Barbosa quanto a Battisti, mas me parece não ter votado por estar em licença por doença.
 
O jurista Carlos Lungarzo, que publica nos próximos dias um livro sobre o caso Battisti, demonstrou com base em documentos europeus a inconsistência dos argumentos italianos contra Battisti e a leviandade de ministros do STF em condenar sem provas o italiano à extradição. Mas nessa primeira tentativa do STF se sobrepor ao Executivo, um precedente foi criado - a última instância judiciária do país, em desrespeito ao princípio básico de Direito, de que não pode haver pena sem prova de crime ou delito, criou a perigosa jurisprudência de que se pode condenar sem provas concludentes.
 
Tal procedimento lembra os do Tribunal Especial na França ocupada e que consistia em dar a aparência de julgamentos legais a condenações pré-decididas pelo governo de Vichy contra personalidades francesas contrárias à Ocupação nazista. Uma constante é a de que toda vez que o Judiciário se prestou a maquiar perseguições políticas como julgamentos legais foi em obediência a ditaduras de direita ou de esquerda. Ora, no Brasil, ocorre uma diferença fundamental - a última instância do Judiciário assumiu autonomia própria e age inclusive contra o governo, com o intuito de desmoralizá-lo e de assumir suas prerrogativas e seu poder, para confiná-lo apenas na governança.
 
O exemplo mais recente de golpe legal, é o do ocorrido no Paraguai, onde o Parlamento, interpretando à sua maneira um texto da Constituição, decretou o impeachment do presidente eleito pelo povo, derrubou-o e passou o poder ao vice-presidente. Ou seja, o Legislativo, contanto com a complacência do Judiciário, deu o golpe no Executivo.
 
Agora no Brasil, a condenação do principal articulador do governo petista, José Dirceu, visa diretamente o governo e o PT, e é um recado claro do STF de que assume o poder, mesmo se seus ministros-juizes não foram eleitos pelo povo. A partir de agora, todas as questões importantes do governo poderão ser decididas pelo STF e não pela presidenta Dilma e isso pode implicar até na privatização de estatais, como a cobiçada Petrobras, como no impeachment de governadores, prefeitos e até numa inelegibilidade do ex-presidente Lula.
 
Outro aspecto importante na condenação de José Dirceu está na exigência de ser colocado em cela comum, desobedecendo-se outro preceito legal, que beneficia com tratamento diferente a todos os universitários e ao qual Dirceu teria direito como bacharel em Direito. Essa exceção reforça a suspeita de não se tratar de um julgamento equitável, mas de um ajuste de contas, alguma coisa parecida com vingança ou revanchismo de perdedores.
 
Por que tanto ódio contra José Dirceu ? Não pertenço ao PT e me sinto à vontade para comentar. Mesmo se muitos petistas fundadores deixaram o partido por divergir das concessões feitas pelo governo Lula, não se pode negar ter sido Dirceu o principal articulador da eleição de Lula para a presidência. Além disso, foi um resistente contra a ditadura militar. E, embora acusado sem provas mas por ilação como envolvido no episódio do Mensalão, não se tratava de enriquecimento pessoal.
 
Se nos reportarmos ao ano 2005, quando estourou o caso Mensalão, fica evidente que o alvo daquela campanha era o presidente Lula - o objetivo principal era o de se provocar um impeachment e derrubar Lula. Eu fazia a correção das provas do meu livro sobre Maluf (Dinheiro Sujo da Corrupção - Geração Editorial), e tive tempo de incluir um capítulo sobre o que considerei como um escândalo de excessivas proporções. Não se tratava de se justificar o ato de compra dos votos do parlamentares, mas de uma observação realista.
 
E eu citava, como costumo citar, o exemplo suíço, país considerado dos mais honestos, onde existe uma versão legal de um tipo de mensalão. Todo deputado ou senador eleito recebe imediatamente o convite das grandes empresas suíças, desde bancos a laboratórios farmaceuticos, para ser vice-presidente do conselho de administração. O objetivo é o de evitar leis que prejudiquem tais bancos ou empresas e o de criar leis que os beneficiem. Trata-se de uma compra indireta dos votos dos parlamentares, que poderia também ser considerada como lobby, mas que implica no pagamento de um salário mensal ao parlamentar.
 
O então presidente do equivalente à nossa Câmara Federal, Peter Hess, era em 2005, vice-presidente de 42 conselhos de administração de empresas suíças, o que lhe garantia mais de 400 mil dólares mensais. E isso sem qualquer escândalo.
 
A diferença é que, na Suíça, não é um partido que compra o voto de parlamentares mais ou menos honestos, porém as empresas privadas. O fato de na Suíça haver uma versão local de mensalão não justifica essa prática, mas pode lhe dar a verdadeira dimensão.
 
É evidente que, no Brasil, não se condena o Mensalão como prática desonesta, trata-se de um jogada política para se desmoralizar os petistas, que acabou não surtindo efeito nas eleições (por que diabo o STF escolheu a época das eleições para julgar o Mensalão?), mesmo porque dizem ter havido compra de votos na emenda constitucional que permitiu a reeleição de FHC. Iria o STF julgar agora, sem provas, também o FHC? Outro aspecto importante - estão condenando os chamados corruptores de parlamentares, mas não punem os parlamentares corruptos ?
 
E agora ? O STF deixou de interpretar as leis, de manter ou anular julgamento, para aplicar sentenças e mesmo acusados não parlamentares não tiveram direito a julgamentos normais em primeira e segunda instâncias. Deve-se aceitar a humilhação de José Dirceu e os riscos que correrá em prisão comum, quando dentro de dois anos a Suíça devolverá os milhões bloqueados de Maluf, por não ter havido condenação pelo STF ? Quando Pimenta Neves vive tranquilo em prisão domiciliar depois de ter matado a sangue frio a jornalista Sandra Gomide ?
 
Em termos de recursos, as possibilidades de se adiar a execução da pena de José Dirceu são mínimas. Que tribunal acima do STF poderá arguir da condenação sem prova formal ? E da inconstitucionalidade do Judiciário ultrapassando sua competência ? Só um Conselho Constitucional, caso existisse, como na França, onde leis e sentenças ou decisões judiciárias podem ser anuladas em caso de inconstitucionalidade.
 
Ou será que José Dirceu é culpado por ter contribuído à diminuição da desigualdade social no Brasil, à ascenção dos negros às escolas e universidades, à projeção do Brasil como sexta potência mundial ? ou de ter articulado a eleição à presidência de um operário quebrando a hegemonia das elites brasileiras ?
 
Talvez o Brasil ainda não tenha se curado dos repetitivos golpes e tentativas de golpe, constantes da história da República. Getúlio se matou porque havia movimento de tropas para derrubá-lo; Café Filho e Carlos Luz queriam invalidar a eleição de Juscelino e Jango; depois da renúncia de Jânio, Jango só assumiu com a criação do parlamentarismo, um golpe indireto para anular seu poder presidencial; mesmo assim, foi derrubado pelos militares para não concretizar as reformas de base; depois da ditadura militar corremos agora o risco de uma ditadura light ou soft ditada pelo STF ?
 
Em todos esses episódios, os golpes e tentativas visavam governos populistas ou reformistas interessados em dar mais direitos aos trabalhadores ou excluídos e restringir os privilégios da elite dominante.
 
* Jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura, é líder emigrante, membro eleito do Conselho Provisório e do atual Conselho de emigrantes (CRBE) junto ao Itamaraty. Criou os movimentos Brasileirinhos Apátridas e Estado dos Emigrantes, vive em Berna, na Suíça. Escreveu o livro Dinheiro Sujo da Corrupção sobre as contas suíças secretas de Maluf. Colabora com o Expresso, de Lisboa, Correio do Brasil e agência BrPress
 

RTP-PSP: NUNO SANTOS DIZ QUE FOI UM PRETEXTO PARA O AFASTAR

 

TSF
 
Nuno Santos reage ao inquérito da RTP dizendo que as conclusões estavam condicionadas à partida e que, por isso, se exige um apuramento independente.
 
Eis, na íntegra, o texto que Nuno Santos distribuiu:
 
«Tomei conhecimento do texto intitulado "Resumo dos factos apurados em sede de Inquérito", que pretenderá ser uma conclusão do intitulado "inquérito aos factos relacionados com a entrada indevida, facultada pela Direção de Informação de Televisão, de elementos estranhos à empresa tendo em vista a visualização e eventual entrega de imagens não emitidas por qualquer serviço de programas da RTP, relacionadas com os incidentes verificados no dia 14 de novembro".
 
Sobre esse título, já de si tendencioso e contra o qual tive ocasião de me pronunciar, entendo que o mesmo - não refletindo a verdade dos factos - é já um convite às conclusões à medida que, pelos vistos, resultaram do auto-denominado "inquérito".
 
Não conheço o relatório final nem a prova que terá sido produzida e, preparado que estou para todas as surpresas, entendo que a esses elementos me deve ser dado acesso para que me possa defender.
 
O "resumo" que foi divulgado é-me pessoalmente dirigido, o que é tanto mais estranho quanto me foi transmitido telefonicamente ao final do dia de sexta-feira 23 e posteriormente reiterado por escrito a meu pedido, que não havia necessidade de me ouvir no "inquérito", pois teriam sido recolhidos todos os elementos relevantes para o apuramento dito "rigoroso" dos factos. E que factos eram? A resposta foi lapidar: "Esses que andam aí nos jornais". Se fui ouvido, e por insistência minha, fiquei com a consciência plena de que o meu depoimento de nada poderia servir, como veio a verificar-se. Um desfecho incompreensível!
 
Considerando que:
 
a. O "resumo do inquérito" contem graves falsidades e lamentáveis juízos de valor;
 
b. Não autorizei em momento algum, e quero deixar isso bem claro, o visionamento de "brutos" sobre os incidentes de 14 de novembro;
 
c. A não saída dos DVDs, cuja transcrição fora feita sem meu conhecimento, deveu-se à minha intervenção e à do Diretor Adjunto de Informação;
 
d. Ausente em Londres, pedi a seguir um contacto pessoal com o Diretor Geral para discutirmos o assunto, tendo o mesmo sido concretizado no dia útil seguinte;
 
e. Os meus comportamentos acima referidos não se coadunam com qualquer actuação desleal ou desconforme às regras;
 
f. Ainda meses antes tinha eu recusado ao Provedor do Espectador, conforme é do conhecimento da Redacção, acesso aos designados "brutos" numa reportagem sensível sobre a utilização de crianças da Casa Pia em experiências científicas, tendo ficado bem claro o meu pensamento sobre o tema;
 
g. Como se explicaria que, de repente, tivesse mudado tão radicalmente a minha posição de fundo sobre esta matéria?
 
h. Há semelhanças flagrantes entre os tópicos do "resumo" agora dado a público e aqueles que me foram referidos, antes da abertura do "inquérito", pelo Presidente do Conselho de Administração. Aliás, a declaração deste órgão a anunciar a minha demissão contém já estas conclusões, antes do "inquérito".
 
i. Os inquiridores da RTP dependem do Conselho de Administração, o que torna evidente a necessidade de uma entidade imparcial apurar a verdade.
 
Só posso concluir o seguinte:
 
1. O resultado do "inquérito" estava à partida condicionado;
 
2. Todo este caso se afigura um pretexto para obter e, depois, justificar o meu afastamento;
 
3. Não compreendo que se manche a reputação de profissionais, e por arrastamento se coloque potencialmente em perigo a integridade física de repórteres da RTP que cubram as próximas manifestações, só com o objetivo de arranjar esse pretexto.
 
Durante os últimos vinte meses foi possível trabalhar na Informação da RTP com inteira liberdade e total independência perante todos os poderes e forças políticas, o que só pode ter causado incómodos. Trabalhar com inteira liberdade e total independência não é um detalhe desprezível nestes tempos incertos para o jornalismo e no clima que se vive na empresa e no país.
 
Termino reiterando a absoluta necessidade de um inquérito a conduzir por entidade imparcial, seja a ERC, o Sindicato dos Jornalistas ou a Comissão da Carteira Profissional do Jornalista, para o qual desde já volto a manifestar a minha total disponibilidade.
 
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Portugal: CHEFIAS MILITARES - DA BRIGADA DO REUMÁTICO À DOS LAMBE-BOTAS?

 


Redação PG, com TSF
 
As chefias militares condenaram as atitudes públicas dos militares que têm contestado as políticas do (des)governo de Passos Coelho relativas aos diversos ramos das Forças Armadas. Uma condenação inusitada e servil perante os atuais poderes que pode muito bem ser considerada ter origem numa Brigada de Lambe Botas.
 
Antes de 25 de Abril de 1974 era sabido que para além das chefias serem compostas por uma brigada similar aqueles também eram denominados Brigada do Reumático em consideração às suas idades, mentalidades compostas por um conservadorismo fascizante. Ocorre porém que as atuais chefias são mais jovens e, que se saiba, não são oriundas das parasitantes juventudes partidárias como muitos dos atuais (des)governantes, o que leva a supor aos cidadãos comuns que só podem ser constituidas por lambe-botas ou lambe-ministros, independentemente da desconsideração que eles infligem à instituição militar e à soberania da Pátria que os militares juraram defender com a sua própria vida. E a soberania da Pátria inclui os direitos constitucionais e a democracia. Que se saiba os militares contestários e patrióticos não têm violado estes direitos.
 
As presentes chefias militares deviam estar recordadas de que uma vasta maioria de portugueses foram militares por fruto (salazarento) da demorada guerra colonial. É assim que mesmo depois de um ex-combatente ou, simplesmente, um ex-militar regressar à vida cívil dificilmente perde as suas caracteristicas de camaradagem e patrioticas com os que - mesmo passado muitos anos - constituem e são o efetivo corpo daquela instituição. Sendo por isso sensiveis e atentos a quase tudo que diga respeito à família militar. Ora, atentamente, cidadão algum se apercebeu de irregularidades e comportamentos condenáveis por parte dos militares contestarios, o que poderá levar-nos com eventual legitimidade a admitir a possibilidade de estarmos perante uma Brigada de Lambe-Botas nas chefias militares. Era o que faltava neste Portugal tão deslavado de valores. Se assim não é o melhor será explicarem-se convenientemente e sem sofismas porque tal atitude é muito preocupante.
 
Segue a notícia, para que melhor se entenda.
 
Associações desagradadas com condenação de chefias militares
 
TSF
 
A Associação Nacional de Sargentos diz que esta condenação pode ter tido dedo político, ao passo que os oficiais das Forças Armadas acusam as chefias de ter «posturas descabidas».
 
As associações militares dizem estar surpreendidas e desagradas com a condenação das suas chefias, que criticaram as atitudes públicas destas associações, num comunicado publicado na página da Internet do Exército.
 
Para o presidente da Associação Nacional de Sargentos, o comunicado do Conselho de Chefes do Estado Maior «possa ter sido movido ou acionado pelo poder político no sentido de criar clivagens e divisões entre os militares».
 
Lima Coelho lembrou que «não seria a primeira vez que tal aconteceria» e disse ter ficado preocupado com o facto de o secretário de Estado ter indicado que estava a preparar todas as medidas relativas ao Orçamento com as chefias militares.
 
Segundo esta associação, todas as manifestações e processos em que têm participado estão consagrados na lei e não envergonham as forças militares, ao contrário do que os chefes militares disseram em comunicado.
 
O presidente da Associação dos Oficiais das Forças Armadas entende que todos os militares, sejam chefes ou não, deveriam rumar no mesmo sentido e que se alguém está a «manchar a postura institucional das Forças Armadas são posturas descabidas» como as tomadas pelas chefias militares.
 
«Não faz sentido que duas instituições, as chefias e associações profissionais, que concorrem, embora de maneira diferente, para atingir determinados objetivos e depois se venha dizer que uma parte está a agir em desconformidade com algo cuja referência desconheço», adiantou Manuel Cracel.
 
Esta associação diz mesmo desconhecer aquilo que foi feito pelas chefias militares para salvaguardar as condições dos militares no Orçamento de Estado para 2013.
 

Inquérito da RTP conclui que Nuno Santos autorizou PSP a ver imagens dos confrontos

 

Maria Lopes – Público, ontem
 
O ex-director de Informação da RTP autorizou a PSP a visionar todas as imagens da manifestação frente ao Parlamento.
 
Nuno Santos, o ex-director de Informação da RTP, foi quem autorizou a PSP a ver a totalidade das imagens captadas pelas câmaras da estação nos confrontos junto ao Parlamento, no dia 14.
 
Esta é uma das conclusões do inquérito interno que a administração da RTP mandou instaurar na passada semana, para apurar o que realmente se passou e que permitiu que dois elementos da PSP tenham estado nas instalações da empresa a visionar imagens da carga policial.
 
Questionado pelo PÚBLICO, Nuno Santos recusou-se a fazer declarações, limitando-se a dizer que tomará “uma posição ainda durante o dia de hoje”.
 
O director-geral de Conteúdos, Luís Marinho, sai completamente ilibado do caso, porque o inquérito apurou que este “só teve conhecimento dos factos, tal como tinham ocorrido”, no dia 19, e, “de forma detalhada”, no dia 20. Nessa altura, transmitiu “de imediato” ao presidente da RTP, Alberto da Ponte, o que se passava.
 
As imagens que os dois elementos da PSP viram foram “transcritas“ para DVD, mas “não chegaram a sair da RTP”, conseguiu-se também concluir.
 
De acordo com uma informação divulgada pelo conselho de administração com o “resumo dos factos apurados em sede de inquérito”, a PSP pediu à subdirecção de Produção de Informação, ainda no próprio dia 14, a “escolha e cedência das imagens dos incidentes do dia da greve, recolhidas pela RTP, bem como o seu visionamento nas respectivas instalações”.
 
A autorização para que isso acontecesse veio do então director de Informação, e a PSP poderia fazê-lo, no dia seguinte, “num sítio discreto que não no Arquivo”, apurou este inquérito.
 
No dia 15, a PSP visionou “imagens dos incidentes através de um computador, com a aplicação Q-View e, através de laptop, cassetes contendo as imagens captadas pelos operadores repórteres da RTP”. Ainda que “grande parte” dessas imagens seja das que a RTP de facto emitiu em directo ou em peças jornalísticas nos diversos blocos noticiosos dos vários canais, a PSP também viu outras que “nunca foram transmitidas”. Isso faz com que não tenham sido “seguidos os procedimentos habituais na empresa”, aponta este resumo dos factos apurados.
 
Ainda nesse mesmo dia as imagens visionadas foram gravadas em DVD, mas estes, porém, “não chegaram a sair da RTP”. Só no dia 16, quando a PSP pediu formalmente ao Arquivo as imagens, é que foram cedidas as “emitidas na RTP1 e na RTP Informação (directos e noticiários, 3h22, em dois DVD) através dos procedimentos habituais”.
 
Os factos, tal como tinham ocorrido, só chegaram ao director-geral no dia 19. E apenas no dia 21 houve reacção do presidente, Alberto da Ponte, que considerou que a “presença da polícia nas instalações da RTP para aquele objectivo, autorizada pelo referido director, ao arrepio de todos os procedimentos internos instituídos e sem que disso tivesse dado conhecimento prévio” à administração, obrigava a que esta perdesse a “confiança” em Nuno Santos. A consequência lógica foi o pedido de demissão de Nuno Santos, conhecido na quarta-feira passada, ao início da noite.
 
Na terça-feira, a assessoria do conselho de administração disse ao PÚBLICO que as conclusões só seriam conhecidas ao fim da tarde de quarta-feira, depois de o presidente da RTP, Alberto da Ponte, entregar o relatório na ERC – Entidade Reguladora para a Comunicação Social, com a qual tem um encontro às 17h, por uma questão de “cortesia”.
 
Porém, a assessoria esclareceu hoje ao PÚBLICO que os presidentes da RTP e da ERC entenderam que este resumo devia ser “libertado mais cedo”.
 

Portugal: ESTIVADORES REBENTARAM PETARDOS JUNTO AO PARLAMENTO

 


Fabíola Maciel e Félix Ribeiro – Expresso, foto Daniel Rocha
 
Trabalhadores portugueses e europeus juntam-se contra nova lei dos portos
 
Centenas de trabalhadores portuários portugueses e estrangeiros rebentaram, nesta quinta-feira, vários petardos em frente à Assembleia da República.
 
Após três meses de paralisações sucessivas, os estivadores estão concentrados em frente à escadaria da Assembleia da República. O protesto acontece no dia em que será votada a nova lei do trabalho portuário.
 
Aos estivadores portugueses da Frente Comum juntaram-se, esta quinta-feira, trabalhadores portuários de oito países europeus contra uma lei que é vista como “um balão de ensaio” para uma reforma portuária ao nível da União Europeia.
 
Os estivadores protestam contra um novo regime do trabalho portuário que, alegam, vai resultar na "precarização e instabilidade" dos actuais postos de trabalho nos portos. Para além da limitação das funções que podem ser desempenhadas hoje pelos estivadores, a nova lei do Governo insere um tecto máximo de 250 horas de trabalho extraordinário por ano.
 
Vítor Dias, presidente do sindicato de estivadores do Centro e Sul, garantiu que “qualquer que fosse o resultado” da votação parlamentar, “os estivadores vão continuar em luta”. Espera-se que a maioria parlamentar aprove a nova lei, não estando ainda clara a intenção de voto do Partido Socialista.
 
Desde a Praça do Município até São Bento, as ruas de Lisboa foram “pintadas” por coletes amarelos e laranja fluorescentes. Ao longo do desfile foram rebentadas dezenas de petardos e à chegada ao Parlamento três cordas de explosivos foram rebentadas sob o olhar de duas dezenas de polícias. Ao lado e à parte da manifestação dos estivadores está um grupo de empresários de diversão, que esteve durante a manhã também em protesto.
 

Portugal: PSP NÃO PODE PEDIR IMAGENS À RTP

 


Paulo Gaião – Expresso, opinião, em Blogues
 
A Procuradoria Geral da República já se pronunciou num parecer precisamente sobre a questão do pedido da polícia de gravações em bruto às televisões e sobre a cedência destas por parte dos jornalistas. Foi em 1995, a pedido da Alta Autoridade para a Comunicação Social.
 
Parece não haver dúvidas. A Polícia não pode pedir directamente às estações televisivas os brutos televisivos, abrangidos pelo sigilo profissional dos jornalistas.
 
Parece não haver dúvidas. Os jornalistas da RTP (incluindo repórteres da imagem) que estiveram envolvidos na cobertura da manifestação de 14 de Novembro à frente da Assembleia Pública tinham de ser informados pelos seus directores para levantarem o sigilo profissional em relação aos brutos televisivos pedidos pela polícia. Ora parece certo que tal não aconteceu na RTP.
 
Parece não haver dúvidas. Os directores de informação da RTP tinham o dever de garantir junto da policia ou outras entidades externas o sigilo profissional dos jornalistas envolvidos na mesma cobertura da manifestação. Ora, a avaliar pelo inquérito interno da RTP, este dever não foi salvaguardado.
 
O parecer da PGR foi suscitado em virtude de "certas entidades, nomeadamente o Ministério Público, a Polícia Judiciária, o Provedor de Justiça e Comissões de Inquérito da Assembleia da República", solicitarem ou determinarem "a operadores televisivos que lhes forneçam gravações em bruto, isto é, cujo conteúdo não foi tornado público, de factos e acontecimentos que tenham realizado."
 
Sobre a Polícia Judiciária (naturalmente extensível à PSP) refere-se no parecer:
 
"Tratando-se de documentos ou objectos a apreender, para ficarem juntos ao processo - caso das referidas "gravações embruto" -, deverão observar-se as regras dos artigos 178º, nº 3, e 182º, nº 1, do Código de Processo Penal, nos termos das quais: as apreensões devem ser autorizadas por despacho da autoridade judiciária, salvo quando efectuadas no decurso de revistas ou de buscas, caso em que lhe são aplicáveis as disposições previstas neste Código para tais diligências (artigo178º, nº 3); os jornalistas (e as empresas de comunicação social), como as demais pessoas indicadas nos artigos 135º e 136º, devem apresentar à autoridade judiciária, quando esta o ordenar, os documentos ou quaisquer objectos que tiverem na sua posse e devam ser apreendidos, salvo se invocarem, por escrito,segredo profissional ou segredo de Estado (artigo 182º, nº 1).
 
Destes normativos resulta a impossibilidade de a Polícia Judiciária requerer directamente aos jornalistas e respectivas estações televisivas a apresentação das referidas "gravações em bruto", para serem apreendidas e juntas a processo, devendo, antes, solicitar à autoridade judiciária competente que o faça, sempre que julgado necessário à investigação em curso.
 
Ter-se-á presente, de novo, o princípio atrás assente de que "onde há dever de sigilo não há dever de cooperação com qualquer autoridade", salvo se existir disposição - o que não é o caso - que, sobrepondo-se-lhe, afaste esse dever de sigilo. Daí que, tratando-se ou julgando tratar-se de matéria sigilosa, podem (os jornalistas) e devem (as respectivas empresas) invocar o carácter sigiloso do material requisitado pela competente autoridade judiciária, recusando a sua apresentação.
 
Nesse caso resta à autoridade judiciária lançar mão do mecanismo, já descrito, previsto nos artigos 182º, nº 2, e 135º, nº 2, do Código de Processo Penal. Sintetizando: Não sendo a Polícia Judiciária uma autoridade judiciária - mas, sim,um órgão da polícia criminal que actua sob a direcção e na dependência funcional da autoridade judiciária competente -, deve aquela entidade, quando o considerar necessário, solicitar à autoridade judiciária competente que ordene a apreensão das referidas "gravações em bruto", (artigos 178º, nº 3, e 182º, nº 1, do Código de Processo Penal), desencadeando-se depois, se for caso disso, o mecanismo já conhecido, dos artigos 182º, nº 2, e 135º, nº 2 deste diploma legal."
 
As conclusões do parecer são esclarecedoras:
 
"1. O direito ao sigilo profissional dos jornalistas, incluindo na categoria de jornalistas os operadores de televisão, destina-se, essencialmente, a garantir-lhes a protecção das fontes de informação - artigos 38º, nº 2, alínea b), da CRP, 5º, alínea c), e 8º, nº 1, da Lei nº 62/79, de 20 de Setembro, que aprovou o Estatuto do Jornalista;

2 - O conceito de fonte de informação abrange não apenas as pessoas, como autores de declarações, opiniões e juízos, transmitidos ao jornalista, mas também os documentos e arquivos jornalísticos, em suporte escrito, de som e de imagem - artigo 7º, nº 3, alínea b), daquele Estatuto;

3 - Os jornalistas têm o direito e os directores das empresas de comunicação social, nomeadamente das estações televisivas, o dever de não revelar e exibir as fontes referidas na conclusão anterior, salvo consentimento expresso do interessado (nº 2 do artigo 8º da Lei nº 62/79);

4 - Ressalvada a existência de norma que afaste a oponibilidade da colaboração solicitada pelas autoridades judiciárias, o sigilo referido nas conclusões anteriores só pode ser quebrado por decisão do tribunal, na situação e nos precisos termos do nº 3 do artigo 135º do Código de Processo Penal;

5 - Antes de ser suscitada a quebra do sigilo, a autoridade judiciária, se tiver dúvidas sobre a legitimidade da escusa, procede às averiguações necessárias e, se concluir pela ilegitimidade, ordena ou requer ao tribunal que ordene a prestação do depoimento ou o fornecimento dos elementos probatórios;

6 - Fora dos casos especiais e da situação referidos nas conclusões anteriores, os magistrados do Ministério Público não dispõem de mecanismo legal que lhes permita quebrar ou requerer a quebra do referido sigilo;
 
7 - A Polícia Judiciária, no exercício das suas competências de investigação criminal, sob a direcção e na dependência funcional da autoridade judiciária competente, pode solicitar a esta, se necessário, a apreensão de objectos, nomeadamente gravações em poder dos jornalistas e das respectivas empresas de comunicação social, nos termos e para os fins dos artigos 178º e 182º do Código de Processo Penal, lançando mão, se for caso disso, do mecanismo legal fixado nos artigos 135º nºs. 2 e 3, e 182º, nº 2 deste diploma legal;
 
8 - Face ao disposto nos artigos 12º, nº 2, e 30º da Lei nº 9/91, de 9 de Abril, os jornalistas podem e os directores e as empresas de comunicação social devem invocar, se for caso disso, o sigilo referido nas conclusões anteriores relativamente às solicitações do Provedor de Justiça;

9 - As comissões parlamentares de inquérito gozam de todos os poderes de investigação das autoridades judiciárias - artigos 181º, nº 1, da CRP e 13º, nº 1, da Lei nº 5/93, de 1 de Março -, podendo, por isso, ordenar a prestação de depoimentos ou a apresentação de documentos, nos casos e termos dos artigos 135º, nº 2, e 182º, nº 2, do Código de Processo Penal, bem assim suscitar a intervenção do Tribunal da Relação nos termos e para os fins do nº 3 do referido artigo 135º;
 
10 - Não se tratando de fontes de informação em que seja legítima a invocação do sigilo, os jornalistas, os directores e as empresas de comunicação social devem prestar a colaboração a que têm direito as autoridades referidas nas conclusões anteriores, nomeadamente, fornecendo-lhes "gravações em bruto" que tenham em seu poder."
 
Este parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, votado por maioria, pronunciou-se no âmbito das anteriores redacções do Estatuto do Jornalista e do Código de Processo Penal. Mas as alterações feitas entretanto, mesmo as relacionadas com medidas cautelares de prova, não parecem prejudicar as conclusões do parecer.
 
 

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