segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Angola: A NOSSA ISABELINHA CONTINUA NA RIBALTA – FORBES APONTA FAVORECIMENTO

 


Orlando Castro e William Tonet – Folha 8, edição 1155 – 17 agosto 2013
 
À falta de espelhos lá por casa, o pessoal da revista Forbes teima em adulterar a nossa história, esquecendo-se que esta só pode ser escrita pelos vencedores. E estes são os donos do regime. Em Janeiro, a revista garantia que Isabel dos Santos, a filha mais velha do Presidente José Eduardo dos Santos, era – como se isso fosse crime - a mulher mais rica de África. Eis senão quando, agora, a Forbes avança com um trabalho em que passa a pente fino as origens de uma tão avultada fortuna.
 
Diz a publicação que tudo tem origem no facto de Isabel ficar com uma parte, sempre de leão, das empresas que se estabelecem no nosso país, ou da providencial assinatura do pai (e então estavam à espera que o progenitor servisse para quê?) numa lei ou decreto. O trabalho da Forbes é da autoria de Kerry A. Dolan, uma das coordenadoras da lista anual dos milionários, e pelo nosso colega Rafael Marques, que dizem ter falado com muita gente no terreno e consultado muitos documentos. Eis aqui o primeiro estrondoso falhanço da matéria apresentada. Desde logo não falaram com a única pessoa com conhecimento dos factos e detentor do diploma de dono da verdade: José Eduardo dos Santos. A isso acresce que documentos válidos são apenas, reconheça-se, os que constam da Presidência e que não foram obviamente consultados.
 
Tanto quanto se sabe, nem Isabel dos Santos nem o empresário português Américo Amorim, parceiros umbilicais nos negócios mais transparentes do mundo, foram consultados pelos autores. É uma falha grave. Kerry A. Dolan e Rafael Marques falaram com as galinhas sobreviventes mas esqueceram-se de auscultar a versão da raposa que é dona do galinheiro.
 
PRINCESA DESMENTE AS CALÚNIAS
 
Fazendo uso da sua habitual e congénita filantropia, Isabel dos Santos achou por bem desmentir as afirmações da Forbes. Não teria sido necessário porque, na verdade, ninguém acredita na revista e todos se ajoelham reverencialmente perante o “escolhido de Deus”, venerando também todo o seu séquito. Isabel dos Santos afirma que o artigo é obra de “um conhecido activista político que, patrocinado por interesses escondidos, passeia pelo mundo a atacar Angola e os angolanos”. O comunicado do gabinete da Presidência… da filha do presidente esclarece que “Isabel dos Santos é uma empresária independente e uma investidora privada, representando unicamente os seus próprios interesses”.
 
A revista norte-americana, cujo valor e isenção fica a anos-luz do emblemático “Jornal de Angola”, diz preto no branco que a história de Isabel dos Santos, a milionária de 3000 milhões de dólares num país onde 70% dos habitantes vivem com menos de 2 dólares por dia, “é uma rara janela para a mesma trágica narrativa cleptocrática em que ficam presos muitos outros países ricos em recursos naturais”. José Eduardo dos Santos, de 71 anos de idade, é o impoluto Presidente da que já foi Popular mas que hoje é apenas República de Angola desde 1979, e é o não menos impoluto chefe de Estado que governa há mais anos sem ser monarca.
 
Todo este curriculum, ao contrário do que advoga a Forbes, legitima que José Eduardo dos Santos inclua a sua filha em todos os grandes negócios feitos em Angola ou em países a quem, como Portugal, concedeu o estatuto de protectorado. Para a revista, trata-se de uma “forma de extrair dinheiro do seu país, enquanto se mantém à distância, de maneira formal”, o que lhe permite, “se for derrubado, reclamar os seus bens, através da sua filha. Se morrer enquanto está no poder, ela mantém o saque na família.”
 
RIQUEZA DE FORMA TRANSPARENTE?
 
Isabel dos Santos tem 24,5% da Endiama, a empresa concessionária da exploração mineira no Norte do país – criada por decreto presidencial, que exigia a formação de um consórcio com parceiros privados. Os parceiros privados da filha do Presidente, que incluíam negociantes israelitas de diamantes, criaram a Ascorp, registada em Gibraltar. Na sombra, diz a Forbes, citando documentos judiciais britânicos, tinha o negociante de armas russo Arkadi Gaidamak, um antigo conselheiro do Presidente angolano durante a guerra civil de 1992 a 2002.
 
O escrutínio internacional dedicado aos diamantes, que também são sangue, explica a revista, aconteceu no mesmo período em que Isabel dos Santos transferiu a sua parte do negócio, que a Forbes classifica como “um poço de dinheiro”, para a mãe, uma cidadã britânica. Tudo continua em casa, sublinha a revista. Além dos diamantes, que sendo de sangue deixam os angolanos exangues, Isabel é dona de 25% da Unitel, a primeira operadora de telecomunicações privada do país, e que resultou de um decreto presidencial directamente para a filha mais velha. “Um porta-voz de Isabel dos Santos disse que ela contribuiu com capital pela sua parte da Unitel, mas não especificou a quantia; um ano depois, a Portugal Telecom pagou 12,6 milhões de dólares por outra fatia de 25%”, escreve a Forbes.
 
Os 25% que Isabelinha tem da Unitel são avaliados, segundo analistas financeiros ouvidos pela revista, na módica quantia de mil milhões de euros. A parceria com Américo Amorim, que abarca as áreas financeira, através do banco BIC, e petrolífera, através da Amorim Energia e dos seus negócios na Galp e com a Sonangol, tem sido um sucesso. A revista lembra o investimento de 500 milhões na portuguesa ZON e explica também como Isabel dos Santos acabou por ficar à frente da cimenteira angolana Nova Cimangola, também através (mera coincidência) de negócios com Américo Amorim.
 
Depois de a Forbes a ter declarado como uma bilionária, o “Jornal de Angola”, órgão oficial do regime, exultava a caminha do Prémio Pulitzer com prosas também dignas de um Nobel: “estamos maravilhados por a empresária Isabel dos Santos se ter tornado uma referência do mundo das finanças. Isto é bom para Angola e enche os angolanos de orgulho”. Pois é. Se ao menos o orgulho enchesse a barriga, a esmagadora maioria do nosso Povo daria às filhas o nome de Isabel e aos filhos o de José Eduardo.
 

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