sexta-feira, 16 de maio de 2014

AMEAÇA TERRORISTA CONTRA CUBA VINDA DOS… ESTADOS UNIDOS




Washington se nega a agir para impedir que os grupos da extrema direita cubana da Flórida planejem atentados contra a ilha

Salim Lamrani, Paris – Opera Mundi

Em 6 de maio de 2014, as autoridades cubanas anunciaram a prisão de quatro pessoas residentes em Miami, suspeitas de preparar atentados terroristas contra a ilha. José Ortega Amador, Obdulio Rodríguez González, Raibel Pacheco Santos e Félix Monzón Álvarez partiram da Flórida e “reconheceram que pretendiam atacar instalação militares com objetivo de promover ações violentas”.

O governo acusou outros três residentes em Miami, com graves antecedentes criminais, de serem autores intelectuais do projeto de atentado: “[Os quatro presos] declararam também que esses planos estavam sendo organizados sob a direção dos terroristas Santiago Álvarez Fernández Magriñá, Osvaldo Mitat e Manuel Alzugaray, que viviam em Miami e tinham vínculos estreitos com o famoso terrorista Luis Posada Carriles”.

Desde 1959, Cuba é vítima de uma intensa campanha de terrorismo orquestrada a partir dos Estados Unidos pela CIA e pelos exilados cubanos. Ao todo, foram realizados 7 mil atentados contra a ilha desde o triunfo da Revolução. Custaram a vida de 3.478 pessoas e causaram sequelas permanentes a outras 2.099.

No começo dos anos 1990, depois do desmantelamento da União Soviética e da abertura de Cuba para o turismo, houve um aumento do número de atentados terroristas contra a infraestrutura hoteleira de Havana, executados pela extrema direita cubana de Miami com a finalidade de dissuadir turistas de viajar à ilha, sabotando, assim, um setor vital para a moribunda economia cubana. Os violentos atos causaram dezenas de vítimas e custaram a vida de um turista italiano, Fabio di Celmo.

Os autores desses atos terroristas ainda estão em Miami, onde gozam de total impunidade. O caso de Luis Posada Carriles[foto à direita] é o exemplo perfeito. Antigo policial da ditadura de Batista, foi agente da CIA depois de 1959 e participou da invasão da Baía dos Porcos. É responsável por mais de uma centena de assassinatos, entre eles o atentado de 6 de outubro de 1976 contra o avião civil da companhia Cubana de Aviación (Cubana de Aviação), que custou a vida de 73 pessoas – entre elas, toda a equipe cubana juvenil de esgrima que havia acabado de ganhar os Jogos Pan-Americanos.

Não restam dúvidas sobre a culpa de Posada Carriles: ele reivindicou abertamente sua trajetória terrorista em sua autobiografia intitulada Los caminos del guerrero (Os caminhos do guerreiro) e reconheceu publicamente ser o autor intelectual dos atentados de 1997 contra a indústria turística cubana em uma entrevista ao The New York Times em 12 de julho de 1998. Além disso, os arquivos do FBI e da CIA revelados respectivamente em 2005 e em 2006 demonstram seu envolvimento no terrorismo contra Cuba.

Posada Carriles nunca foi julgado por seus crimes. Pelo contrário. Washington sempre lhe protegeu, recusando-se a processá-lo por seus atos ou a extraditá-lo a Cuba ou à Venezuela (onde também cometeu crimes). Essa realidade desmente as declarações da Casa Branca sobre a luta contra o terrorismo.

Em 1997, Cuba propôs aos Estados Unidos uma colaboração discreta na luta contra o terrorismo. O escritor colombiano Gabriel García Márquez, recém falecido, que mantinha relações amistosas tanto com Fidel Castro como com Bill Clinton, serviu de mensageiro. O governo da ilha convidou dois funcionários do FBI a Havana para lhes entregar um relatório sobre as atuações criminosas de algumas organizações sediadas na Flórida. De fato, os serviços de inteligência cubanos haviam infiltrado vários de seus agentes na Flórida. Mas, em vez de neutralizar os responsáveis pelos atos terroristas, o governo dos Estados Unidos decidiu prender cinco agentes cubanos em 1998 e condená-los a penas sumariamente severas, que vão desde 15 anos de reclusão até duas penas perpétuas, em um julgamento denunciado por várias organizações internacionais. Três dos condenados — Gerardo Hernández, Antonio Guerrero e Ramón Labañino — ainda estão atrás das grades.

Ao mesmo tempo, para justificar sua política hostil de sanções econômicas anacrônicas e cruéis, que afetam todas as categorias da população cubana, além de impedir qualquer normalização das relações bilaterais, Washington não vacila ao colocar Cuba na lista dos países patrocinadores do terrorismo internacional, sob pretexto de que alguns membros da organização separatista basca ETA e da guerrilha colombiana das FARC estejam em Cuba... após um pedido expresso dos governos espanhol e colombiano. Washington reconhece isso claramente em seu informe: “O governo de Cuba apoiou e patrocinou negociações entre as FARC e o governo da Colômbia com o objetivo de conseguir um acordo de paz entre ambas as partes”. Os Estados Unidos reconhecem que “não há informação de que o governo cubano tenha suprido com armamentos ou oferecido treinamento paramilitar a grupos terroristas” e admite que “membros do ETA residentes em Cuba foram realocados com a cooperação do governo espanhol”.

Washington justifica também a inclusão de Cuba na lista dos países terroristas por conta da presença na ilha de refugiados políticos procurados pela Justiça norte-americana desde os anos 1970 e 1980. No entanto, nenhuma dessas pessoas já foi acusada de terrorismo.

Os 33 países da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos) rechaçaram por unanimidade a inclusão de Cuba na lista de países terroristas, apontando um sério revés para Washington. Em uma declaração publicada em 7 de maio de 2014, a Celac expressou “sua total oposição à elaboração de listas unilaterais que acusam Estados de supostamente apoiar e copatrocinar o terrorismo e insta o governo dos Estados Unidos da América a colocar fim a essa prática” que suscita “a reprovação” da “comunidade internacional e da opinião pública dos Estados Unidos”.

Desde há mais de meio século, Cuba sofre violência terrorista orquestrada pelos Estados Unidos — primeiro pela CIA e agora pela extrema direita cubana. A impunidade conferida aos grupelhos violentos e as drásticas penas de prisão aos agentes cubanos que conseguiram impedir a realização de, pelo menos, 170 atentados contra a ilha ilustra as duas caras dos Estados Unidos na luta contra o terrorismo e lança uma sombra sobre a credibilidade de Washington sobre esse tema.

*Doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos pela Universidade Paris Sorbonne-Paris IV, Salim Lamrani é professor titular da Universidade de la Reunión e jornalista, especialista nas relações entre Cuba e Estados Unidos. Seu último livro é intitulado Cuba: les médias face au defí de l'impartialité (Cuba: os meios de comunicação diante do desafio da imparcialidade), Paris, Editions Estrella, 2013, com prólogo de Eduardo Galeano.

Contato: lamranisalim@yahoo.fr ; Salim.Lamrani@univ-reunion.fr

Na foto: Desde o triunfo da revolução, Cuba é vítima de campanha terrorista orquestrada com o aval de Washington

Leia mais em Opera Mundi

ROMPER O SILÊNCIO: O ASSOMAR DE UMA GUERRA MUNDIAL



John Pilger

Por que toleramos a ameaça de outra guerra mundial? 

Por que permitimos mentiras que justificam este risco? A escala do nosso doutrinação, escreveu Harold Pinter, é um "acto de hipnose brilhante, mesmo jocoso e altamente conseguido", como se a verdade "nunca acontecesse mesmo enquanto estava a acontecer".

Todos os anos o historiador americano William Blum publica o seu "sumário actualizado do registo da política externa estado-unidense" o qual mostra que, desde 1945, os EUA tentaram derrubar mais de 50 governos, muitos deles eleitos democraticamente; interferiu grosseiramente em eleições de 30 países; bombardeou as populações civis de 30 países; utilizou armas químicas e bacteriológicas e tentou assassinar líderes estrangeiros.

Em muitos casos a Grã-Bretanha foi uma colaboradora. O grau de sofrimento humano, sem mencionar a criminalidade, é escassamente reconhecido no ocidente, apesar a presença das mais avançadas comunicações do mundo e nominalmente do jornalismo mais livre. Que a maior parte das numerosas vítimas do terrorismo – o "nosso" terrorismo – é muçulmana, é indizível. Que o jihadismo extremo, o qual levou ao 11/Set, foi cultivado como uma arma da política anglo-americana (Operação Ciclone no Afeganistão) é omitido. Em Abril do Departamento do Estado dos EUA observou que, a seguir à campanha da NATO em 2011, "a Líbia tornou-se um abrigo seguro para terroristas".

O nome do "nosso" inimigo mudou ao longo dos anos, de comunismo para islamismo, mas na generalidade é qualquer sociedade independente do poder ocidental e a ocupar território estrategicamente útil ou rico em recursos. Os líderes destas nações obstrutivas habitualmente são violentamente empurrados para o lado, tais como os democratas Muhammad Mossedeq no Irão e Salvador Allende no Chile, ou são assassinados como Patrice Lumumba no Congo. Todos eles são sujeitos a uma campanha de caricaturas e difamação pelos media ocidentais – basta pensar em Fidel Castro, Hugo Chávez, agora Vladimir Putin.

O papel de Washington na Ucrânia é diferente apenas quanto às suas implicações para todos nós. Pela primeira vez desde os anos Reagan, os EUA ameaçam levar o mundo à guerra. Com a Europa oriental e os Balcãs agora como postos avançados da NATO, o último "estado tampão" ("buffer state") a bordejar a Rússia está a ser despedaçado. Nós no ocidente estamos a apoiar neo-nazis num país onde nazis ucranianos apoiaram Hitler.

Tendo engendrado o golpe de Fevereiro contra o governo democraticamente eleito de Kiev, o plano de Washington de tomar a histórica e legítima base naval da Rússia em águas quentes, na Crimeia, fracassou. Os russos defenderam-se, tal como o fizeram contra toda ameaça e invasão do ocidente durante quase um século.

Mas o cerco militar da NATO acelerou-se, juntamente com ataques orquestrados pelos EUA a russos étnicos na Ucrânia. Se Putin puder ser provocado a vir em sua ajuda, o seu papel pré-decretado de "pária" justificará uma guerra de guerrilha dirigida pela NATO que provavelmente se estenderá à própria Rússia.

Putin, ao invés, confundiu o partido da guerra ao procurar uma acomodação com Washington e a UE, ao retirar tropas da fronteira ucraniana e ao instar os russos étnicos na Ucrânia oriental a abandonarem o referendo provocatório do fim de semana. Este povo que fala russo e é bilingue – um terço da população da Ucrânia – deseja há muito uma federação democrática que reflicta a diversidade étnica do país e seja tanto autónoma como independente de Moscovo. Na maior parte não são nem "separatistas" nem "rebeldes" mas cidadãos que querem viver em segurança na sua pátria. 

Tal como as ruínas do Iraque e do Afeganistão, a Ucrânia foi transformada pela CIA num parque temático – dirigido em Kiev pelo director da CIA John Brennan, com "unidades especiais" da CIA e do FBI a instalarem uma "estrutura segura" que supervisione ataques selvagens àqueles que se opõem ao golpe de Fevereiro. Assista aos vídeos, leia os relatos de testemunhas oculares do massacre em Odessa este mês. Bandidos fascistas transportados em autocarro incendiaram a sede da casa dos sindicatos, matando 41 pessoas presas no seu interior. Observe a polícia de prontidão. Um médico descreveu como tentou resgatar pessoas, "mas fui impedido por radicais nazis pró ucranianos. Um deles empurrou-me para longe brutalmente, prometendo que em breve eu e outros judeus de Odessa iriam deparar-se com o mesmo destino... Gostava de saber porque todo o mundo está a manter silêncio".

Os ucranianos de língua russa estão a combater pela sobrevivência. Quando Putin anunciou a retirada de tropas russas da fronteira, o secretário da defesa da junta de Kiev – um membro fundador do partido fascista Svoboda – jactou-se de que os ataques a "insurgentes" continuariam. Em estilo orwelliano, a propaganda no ocidente inverteu isto para Moscovo "a tentar orquestrar conflitos e provocação", segundo William Hague. O seu cinismo vai a par com as grotescas congratulações de Obama à junta golpista pela "notável contenção" a seguir ao massacre de Odessa. A junta, ilegal e dominada por fascista, é descrita por Obama como "devidamente eleita". O que importa não é a verdade, disse outrora Henry Kissinger, mas "o que é percebido ser verdadeiro".

Nos media dos EUA a atrocidade de Odessa foi subestimada como "nebulosa" e uma "tragédia" na qual "nacionalistas" (neo-nazis) atacaram "separatistas" (pessoas a colectarem assinaturas para um referendo sobre uma Ucrânia federal). O Wall Street Journal de Rupert Murdoch condenou as vítimas – "Incêndio fatal na Ucrânia provavelmente ateado pelos rebeldes, diz o governo".

A propaganda na Alemanha tem sido pura guerra fria, com o Frankfurter Allgemeine Zeitung a advertir os seus leitores para uma "guerra não declarada" da Rússia. Para alemães, é uma ironia odiosa que Putin seja o único líder a condenar a ascensão do fascismo na Europa do século XXI.

Um truísmo popular é que "o mundo mudou" a seguir ao 11/Set. Mas o que mudou? Segundo o grande denunciante Daniel Ellsberg, um golpe silencioso teve lugar em Washington e agora domina o militarismo desenfreado. O Pentágono actualmente dirige "operações especiais" – guerras secretas – em 124 países. Internamente a ascensão da pobreza e a hemorragia da liberdade são o corolário histórico de um estado de guerra perpétuo. Acrescente-se o risco de guerra nuclear e a pergunta que resulta é: por que toleramos isto? 

14/Maio/2014

Ver também: 

Portugal-UE: "EM DEFESA DA INDEPENDÊNCIA NACIONAL"



O novo livro do Prof. João Ferreira do Amaral, "Em defesa da independência nacional", pode ser adquirido aqui. 

"A nossa soberania, perdida apenas durante o domínio filipino, está outra vez em perigo. Vivemos num País que não tem a liberdade de fixar o salário mínimo nacional; ou sequer de restabelecer a linha aérea Lisboa-Bragança. São exemplos menores de um mal maior. Ao perdermos autonomia monetária e económica, abdicámos da soberania. E novas ameaças se perfilam. O passo seguinte é submeter os orçamentos de estado à aprovação de Bruxelas. E passarmos anos ao serviço dos interesses germânicos por termos uma dívida superior a 60% do PIB. 

Hoje ameaça-nos uma legião de burocratas europeus. Usam outras armas, legislativas e económicas. E, comandados por uma omnipotente Alemanha, empurram o Velho Continente para um perigoso federalismo, que castigará pesadamente as nações mais fracas". 

Em Defesa da Independência Nacional é o manifesto patriótico de um professor de Economia. Mostra o que nos conduziu aqui. E apresenta a solução. Permanecer na Europa é inevitável – mas não é inevitável a permanência na zona euro. Viver num mundo globalizado pode ser uma oportunidade – mas enquanto nação soberana e não como uma junta de freguesia da EU.

Resistir

Mais lidas da semana