terça-feira, 7 de julho de 2015

ESTADOS UNIDOS – ALTERAÇÕES SENSÍVEIS NA DOUTRINA MILITAR




Em homenagem aos cinco heróicos combatentes anti terrorismo cubanos de visita à África Austral, no momento em que eles passam por Angola

Martinho Júnior, Luanda 

1 – As mudanças de doutrina militar e por tabela de geo estratégias, por parte dos Estados Unidos, têm muito que ver com a evolução dos relacionamentos dos Estados Unidos para com a América Latina, bem como da percepção que os Democratas estão a fazer em relação ao eleitorado norte-americano, em função da tensão dialéctica entre culturas dentro de sua complexa sociedade, algo que está na “ordem do dia” à medida que se vão aproximando as eleições.

O poderoso “lobby” do armamento e das tecnologias electrónicas, com essas alterações, só tem que se regozijar, pois em nada está posto em causa no seu estatuto, bem como na sua pujança e prodigalidade capitalista, muito pelo contrário.

Interpretadas nesse sentido, as alterações na Doutrina militar dos Estados Unidos revertem a desfavor dos esforços da paz global.

Com a tão propagandeada “guerra ao terrorismo”, que a administração de George W. Bush inaugurou, os Estados Unidos meteram-se no atoleiro das “guerras de contra insurgência”, ainda que de forma “assimétrica”, uma experiência que já haviam experimentado antes no Vietname com tão maus resultados e agora experimentou no Afeganistão e no Iraque, ao ponto de procurar a todo o transe retirar-se e ver-se livre dos rescaldos!...

Se bem que após o final da Guerra Fria a iniciativa de “combate ao terrorismo” não se tornou impopular nos Estados Unidos, uma coisa aprendeu a administração Obama: há que a todo o custo saber evitar “guerras de contra insurgência”, mesmo as “assimétricas” (que permitem por exemplo o emprego de drones), sem que isso signifique temer a confrontação em termos de guerra convencional, onde as vantagens têm sido mais evidentes.

Os Estados Unidos, perante seu eleitorado e perante o mundo, estão a ser obrigados a evitar fazer recair sobre si o dedo acusador da esmagadora maioria dos estados, nações e povos da Terra, algo que pode ser simbolizado com a votação anual relativa ao bloqueio contra Cuba, na Assembleia Geral da ONU.
  
2 – Assim sendo, os Estados Unidos estão cada vez mais a encarregar terceiros, seus aliados, para assumirem a “contra insurgência”, ainda que sob o rótulo de “anti terrorismo” e por isso tem sido pródigo em promover as condições de expansão do terrorismo em especial no Médio Oriente e em África, enquanto se reserva a si ao papel de condução de confrontações “clássicas”, do tipo em que se empenharam e moveram durante a Guerra Fria, onde o seu “núcleo duro” se sente muito mais à vontade!

Essa é a razão da ambivalência de que se veste agora a doutrina e as geo estratégias da NATO, assim como do “periférico” que em relação ao Pentágono constitui o AFRICOM.

Essa é a razão também do exercício da NATO que se realizará no Mediterrâneo (“Trident Juncture 2015”), que tem como hóspedes Portugal, Espanha e Itália, que é preciso não esquecer, têm alguma experiência (sobretudo Portugal), em “guerras de contra insurgência”, sem deixar de “cultivar” o tipo de “ambientes e cenários” que se estão a recriar a Leste da União Europeia, com fulcro na Ucrânia!…

Passar para aliados-vassalos uma parte dos encargos de “contra insurgência”, assumindo a liderança na confrontação clássica, é de tal maneira aliciante que as alterações sensíveis na doutrina militar e nas geo estratégias afins estão a fazer reverter as coisas na direcção de outra Guerra Fria e, por causa dessas alterações, é muito importante vigiar todos, conforme o tem feito assumido a NSA!...
  
3 – As respostas progressistas da América Latina são em grande parte responsáveis pelas mudanças encetadas e a libertação dos cinco combatentes anti terroristas cubanos que estão de visita à África do Sul, Namíbia e Angola são, até pelo sentido de oportunidade, disso sinal, daí a tentativa de desanuviamento para com Cuba, que se regista ao mesmo tempo em que se verifica o empertigamento em relação à Venezuela Bolivariana, ou em relação aos termos do “incentivo” das oligarquias latino americanas enfeudadas aos seus propósitos desde o México ao cone sul da América, assim como em relação ao reforço militar das bases espalhadas sobretudo na América Central, Colômbia e Peru.

Com a libertação dos cinco combatentes anti terrorismo cubanos, os Estados Unidos estão já a demarcar-se tanto quanto lhes é possível, do papel de mentor directo principal da “contra insurreição” visível à escala global, até por que a experiência fez, à administração Democrata em curso, perceber o nó-cego onde se colocou perante toda a audiência global, quando perdeu, por exemplo, o seu Embaixador Christopher Stevens, na Líbia…

Foi muito provavelmente nessa altura que deram implicitamente valor ao heróico sacrifício dos cinco combatentes cubanos, injustamente julgados, condenados e presos!

Em termos clássicos, sabendo das razões da Rússia e da China tenderem a unir esforços, os Estados Unidos vão procurar que eles cheguem à completa coesão e para isso, atraem a Rússia para uma tensão calculada enfrentando a NATO a ocidente (tendo a Ucrânia como “chave”), enquanto no lado oposto do continente euro-asiático são suas próprias forças do Pacífico que estimulam o enfrentamento à China.

… Todos os estados, nações e povos se têm agora que cuidar do que vem aí, pois uma nova Guerra Fria, nestes termos, vai ser mais perigosa que a “homóloga” do século passado!

Foto: Embaixador J. Christopher Stevens, assassinado em Bengazi, na Líbia, numa data fatídica: 11 de Setembro de 2013

A recordar:
- Cuba foi dos primeiros a condenar o pérfido ataque. (“Cuba condena ataques à Embaixada dos EUA na Líbia” – http://tudoparaminhacuba.wordpress.com/2012/09/14/cuba-condena-ataques-a-embaixada-dos-eua-na-libia/).

A consular (de minha autoria):


“Temo o homem de um só livro”, diz Glezos a Schulz na despedida de Bruxelas




Aos 93 anos, Manolis Glezos terminou o ano de mandato a que se comprometeu como eurodeputado. Na despedida, respondeu às ameaças de Schulz recitando Eurípides em grego antigo, concluindo com a citação de São Tomás de Aquino.

Depois das ameaças do presidente do Parlamento Europeu sobre os gregos não terem produzido o efeito desejado por Martin Schulz, o candidato derrotado dos socialistas à Comissão teve hoje de ouvir uma lição de democracia por parte do herói da resistência grega ao nazismo, que fez a sua última intervenção no Parlamento Europeu.

Glezos recitou em grego antigo o verso de “As Suplicantes”, de Eurípedes, com a resposta de Teseu, o rei de Atenas,  ao enviado de Creonte, rei de Tebas, que lhe perguntara “onde está o tirano da cidade”:

Antes de mais, começaste o discurso por uma falsidade, estrangeiro,
ao procurar um tirano em Atenas que não está sob a chefia
de um só, mas é uma cidade livre.
O povo governa, alternadamente, por rotações
anuais. Neste país ao rico não se concedem
privilégios e o pobre goza de iguais direitos.

“Escolhi este verso em grego antigo e uma citação em latim que acredito que o presidente Martin Schulz conhece bem: Timeo hominem unius libri”. A citação de São Tomás de Aquino – “Temo o homem de um só livro” – com que Glezos terminou o discurso, foi vista como uma crítica ao pensamento único austeritário que domina os corredores do poder em Bruxelas e Berlim, mas também como uma referência à antiga profissão de Schulz quando ganhava a vida como livreiro

InforGrécia


Grécia. Sindicato abre processos a jornalistas por desinformação na campanha




A avalanche de queixas recebidas pelo Sindicato, sobretudo por parte de cidadãos escandalizados pela parcialidade e as mentiras nos noticiários televisivos durante a semana de campanha do referendo de domingo, levou já a nove processos. Alguns canais já retiraram da internet vários vídeos que estão agora sob investigação.

Em reação às queixas recebidas, o Sindicato dos Jornalistas de Atenas, que engloba os profissionais dos órgãos de comunicação social com sede na capital, anunciou hoje a abertura de nove processos disciplinares a associados. Entre eles estão jornalistas dos canais MegaTV, ANT1e SKAI. O sindicato prossegue as investigações com a ajuda de vídeos enviados pelos autores das queixas e denuncia que já no decorrer do seu trabalho houve estações de tv a retirarem alguns dos vídeos mais criticados das repetivas páginas da internet.

Na semana passada, o organismo do sindicato que fiscaliza a conduta profissional dos associados emitiu um comunicado a alertar para situações de “comportamento delinquente, que substitui a função jornalística pela propaganda aberta”, e alertando para a responsabilidade dos jornalistas e o respeito pelos diferentes pontos de vista.

Gregos são os que mais desconfiam dos media, diz Eurobarómetro

Eurobarómetro de 2014 indicava que apenas 21% dos gregos confiavam no que viam na televisão (em Portugal eram 63%). A desconfiança dos gregos em relação aos media não é exclusiva da televisão, e já em 2012 era a internet o meio usado por 46% dos inquiridos (em Portugal por 39%) para obter informação de confiança.

Mas nos últimos meses, e em particular na última semana de grande tensão política, muitos limites foram ultrapassados na cobertura jornalística das televisões gregas. De imagens manipuladas à tentativa de criação de um ambiente de pânico com o encerramento dos bancos, os grandes media – propriedade de oligarcas com ligações ao sistema político-financeiro, construção civil e marinha mercante – não pouparam esforços na campanha pelo ‘Sim’, com as suas reportagens e programas de “comentário político”.

InfoGrécia

ZIZEK: ATENAS E O POSSÍVEL RETORNO DA POLÍTICA




Agora, decisões estratégicas baseadas em poder são disfarçadas sob suposto conhecimento técnico, negociadas em segredo, impostas sem qualquer consulta democrática. O “não” grego pode mudar isso

Slavoj Zizek – Outras Palavras - Tradução: Vila Vudu

O sonoro e inesperado “Não” no referendo grego foi voto histórico, lançado em situação desesperada.

Em meu trabalho, já várias vezes repeti a conhecida piada, datada da última década da União Soviética, de Rabinovitch, um judeu que quer emigrar. O burocrata no guichê da emigração, pergunta por que, e Rabinovitch responde: “São duas razões. A primeira é que tenho medo de que os comunistas percam poder na União Soviética. Depois, vem outro poder, que logo começará a pôr a culpa de todos os erros dos soviéticos, em nós, judeus. E recomeçarão os pogroms antijudeus…”

“Mas” – o burocrata o interrompe, – “tudo isso é perfeito nonsense! Nada vai mudar na União Soviética, o poder dos sovietes durará para sempre!”

“É” – responde Rabinovitch. – “Essa é minha segunda razão”.

Ouvi contar que uma nova versão dessa piada circula agora em Atenas. Um jovem grego visita o consulado da Austrália em Atenas e pede um visto de trabalho. “Por que você quer deixar a Grécia?” – pergunta o funcionário.

“Por duas razões”, responde o grego. “Primeira, que tenho medo de que a Grécia separe-se da UE, o que levará a mais miséria e caos no país”.

“Mas” – o funcionário o interrompe –, “tudo isso é perfeito nonsense! A Grécia continuará na UE e se submeterá a disciplina financeira!”

“É” – responde o grego. – “Essa é minha segunda razão”.

Será que, parafraseando Stálin, as duas escolhas são piores?

* * *
Chegou o momento de avançar para além dos debates irrelevantes sobre erros e possíveis avaliações erradas que o governo grego tenha feito. As apostas estão altas demais.

Que uma fórmula de conciliação sempre desapareça no último instante, nas negociações em curso entre a Grécia e os administradores da União Europeia (UE) já é, por si, evento profundamente sintomático. Afinal, não se trata realmente de questões financeiras reais – nesse plano, as diferenças são mínimas. A UE em geral acusa os gregos de só falarem em termos gerais, de fazerem promessas vagas sem detalhes específicos; e os gregos acusam a UE de tentar controlar até os mais ínfimos detalhes e impor condições aos gregos que são piores, até, que as que o antigo governo impunha. Mas entre as queixas mútuas, há outro conflito, muito mais profundo.

O primeiro-ministro Alexis Tsipras da Grécia observou recentemente que, se ele e Angela Merkel sentassem juntos para jantar e conversar, em duas horas encontrariam fórmula aceitável. O argumento dele é que ele e Merkel, dois políticos, tratariam o desacordo como desacordo político, muito diferente de gerentões tecnocráticos como o presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem.

Se há bandidão emblemático nesse enredo todo é esse Dijsselbloem, cujo lema é “Se caio no lado ideológico das coisas, não consigo nada.”

E isso nos leva ao xis da questão: Tsipras e Yanis Varoufakis, o ex-ministro das Finanças que renunciou dia 6/7, falam como se fossem parte de um processo político aberto, no qual as decisões sempre são, afinal, “ideológicas” (quer dizer: baseadas em preferências normativas), enquanto os tecnocratas da UE falam como se tudo fosse questão de medidas regulatórias a serem detalhadas.

Quando os gregos rejeitam essa abordagem e levantam questões políticas mais fundamentais, são acusados de mentir, de renegar soluções concretas e tal e tal. E é claro que a verdade está do lado dos gregos: a negação do “lado ideológico” que Dijsselbloem tanto quer é ideologia em estado puro. É posição que mascara (apresenta sob forma falsa) medidas regulatórias muito específicas que, de fato, tem raízes em decisões político-ideológicas.

Por conta dessa assimetria, o “diálogo” entre Tsipras ou Varoufakis e seus parceiros na União Europeia frequentemente se assemelha a conversa entre um jovem aluno que quer debate sério sobre questões básicas, e um professor arrogante que, em suas respostas, humilhantemente ignora a questão e ataca o aluno com pontos técnicos (“Sua frase está mal construída! Você não formulou corretamente essa ideia! Você não está levando em conta o que a lei determina!”). Ou até um diálogo entre uma vítima de estupro, que desesperadamente narra o que lhe aconteceu e um policial que continuadamente a interrompe para pedir detalhes burocráticos administrativos do “evento”.

Essa passagem, da política propriamente dita para a administração técnica neutra caracteriza todo nosso processo político: decisões estratégicas baseadas no poder são cada vez mais mascaradas sob regulações administrativas baseadas em conhecimento especializado pressuposto neutro, e são cada vez mais negociadas em segredo e impostas sem qualquer consulta democrática.

A luta que se trava hoje é luta pela cultura econômica e política dominante (Leitkultur) na Europa. As potências da UE defendem o status quo tecnocrático que preserva e mantém há décadas a inércia da Europa.

Em suas Notas para uma Definição de Cultura, o brilhante conservador T.S.Eliot ensina que há momentos nos quais a única escolha que há é entre a heresia e a não crença, isto é, quando a única maneira de poder manter viva uma religião é fazer um corte sectário no âmago do corpo principal.

Essa é nossa posição hoje, em relação à Europa: só uma nova “heresia” (representada hoje pelo Syriza) pode salvar o que ainda vale a pena salvar do legado europeu: a democracia, a confiança no povão, a solidariedade igualitária.

A Europa que vencerá, se o Syriza for atropelado, é uma “Europa com valores asiáticos” (o que, é claro, nada tem a ver com a Ásia, mas tem tudo a ver com a tendência visível e atual no capitalismo contemporâneo, de suspender a democracia).

* * *
Nós, da Europa Ocidental gostamos de olhar para a Grécia como se fôssemos observadores distanciados que acompanham, com compaixão e simpatia, o suplício de uma nação empobrecida. Esse confortável ponto de vista repousa sobre uma ilusão fatídica. A verdade é que o que se passa na Grécia nessas últimas semanas nos concerne a todos, o que está em jogo é o futuro da Europa. Portanto, quando lemos sobre a Grécia desses dias, não esqueçamos que, como diziam os antigos, de te fabula narratur [a fábula fala de ti].

Um ideal está emergindo gradualmente da reação do establishmenteuropeu ao referendo, grego, o ideal que mais bem aparece explícito no título de uma coluna recente de Gideon Rachman no Financial Times: “O elo mais frágil da Eurozona são os votantes.”

Nesse mundo ideal, a Europa livra-se desse “elo mais frágil” e os especialistas ganham poder para impor diretamente o que entendam que sejam necessárias medidas econômicas – supondo que continue a haver eleições, a única função delas é confirmar o que os especialistas já decidiram. O único problema é que essa política de especialistas é baseada numa ficção, a ficção de “ampliar e fingir” (ampliar o prazo para pagar dívidas e fingir que todas as dívidas serão algum dia pagas).

Por que essa ficção é tão renitente? Não é só por tornar mais aceitável a ampliação do prazo, ante os eleitores alemães; não é só, tampouco, porque qualquer cancelamento de dívida grega poderia disparar demandas semelhantes de Portugal, Irlanda, Espanha. É que os que estão no poder não querem realmente que a dívida seja integralmente paga.[1] Os que criam dívidas e administram dívidas acusam os países endividados de não sentirem remorsos! São acusados do crime de se sentirem sem culpas. A pressão dos banqueiros e emprestadores cabe perfeitamente sob a definição do que a psicanálise chama de “superego”: o paradoxo do superego é que, como Freud percebeu, quanto mais obedecemos às suas demandas, mais nos sentimos culpados.

Imaginem um professor pervertido, que dá aos alunos tarefas impossíveis, e depois, sadicamente, goza quando vê a ansiedade e o pânico deles. O verdadeiro objetivo de emprestar dinheiro ao devedor não é receber de volta a dívida paga e o lucro, mas a continuação indefinida da situação de dívida, que mantém o devedor em dependência e subordinação perpétuas. Vale para a maior parte dos devedores, porque há devedores e devedores. Não só a Grécia, mas também os EUA nunca, nem teoricamente, conseguirão pagar sua dívida – o que hoje já reconhecem publicamente. Quer dizer que há devedores que podem chantagear os credores, porque os credores não podem ser deixados entregue à própria sorte e falir (caso de grandes bancos), devedores que podem controlar as condições dos pagamentos (governo dos EUA), e, finalmente, devedores que podem ser arrastados em praça pública e humilhados (a Grécia).

Os emprestadores e administradores de dívidas basicamente acusam o governo do Syriza de não se sentir suficientemente culpado – são acusados do crime de se sentir inocentes. Isso é o que mais perturba oestablishment da UE no governo do Syriza: que ele admite que deve, mas sem culpa alguma. Livraram-se da pressão do superego.

Varoufakis personificou essa posição, nos seus contatos com Bruxelas: como ministro, sempre reconheceu o total peso da dívida e argumentou, muito racionalmente, que, dado que visivelmente a política da UE não havia funcionado, era forçoso encontrar alguma outra opção.

Paradoxalmente, o ponto que Varoufakis e Tsipras repetem sempre é que o governo do Syriza é a única chance que os credores ainda têm para rever pelo menos parte do dinheiro deles. O próprio Varoufakis já comentou sobre o enigma de por que os bancos fizeram jorrar tanto dinheiro dentro da Grécia e colaboraram com um estado clientelista, mesmo já sabendo em que pé estava a situação financeira da Grécia. Fato é que a Grécia nunca se teria endividado tanto sem a conivência do establishment ocidental.

O governo do Syriza sabe muito bem que a principal ameaça não lhe vem de Bruxelas: está na própria Grécia, num estado clientelista dos mais corruptos do mundo. A burocracia da UE deve ser culpada porque, enquanto criticava a Grécia por tanta corrupção e ineficiência, ter continuado a apoiar (e a emprestar muito dinheiro!) à mesma força política (o partido Nova Democracia) que corporificava toda a corrupção e a ineficiência.

O governo do Syriza quer, precisamente, quebrar esse impasse –, como se lê nessa declaração programática de Varoufakis, que expõe o mais radical objetivo estratégico do governo do Syriza:

“Uma saída de Grécia ou de Portugal ou Itália, da Eurozona, logo se desdobrará numa fragmentação do capitalismo europeu, o que gerará uma região a mais de grave superávit recessivo no leste do Reno e norte dos Alpes, enquanto o resto da Europa vê-se nas garras de uma viciosa estagflação. Quem vocês imaginam que se beneficiaria desse desenvolvimento? Alguma esquerda progressista, que nasceria feito fênix das cinzas das instituições públicas europeias? Ou os nazistas da Alvorada Dourada, os neofascistas de várias origens, os xenófobos, ou especuladores? Não tenho absolutamente dúvida alguma sobre qual desses dois grupos se beneficiaria da desintegração da Eurozona. Eu, de minha parte, não estou interessado em soprar ventos novos nas velas dessa versão pós-moderna dos anos 1930s.

“Se tudo isso significa que seremos nós, os adequadamente errantes marxistas, que teremos a tarefa de salvar o capitalismo europeu dele mesmo, que seja! Não por amor a eles, ou por supostamente apreciarmos o capitalismo europeu, a Eurozona, Bruxelas ou o Banco Central Europeu , mas só porque queremos minimizar o sofrimento humano desnecessário que essa crise cobrará.” (10/12/2013, “Confissões de um marxista errante (…)”, Yanis Varoufakis)

A política financeira do governo do Syriza seguiu estritamente essas linhas de orientação: sem déficit, disciplina rígida, mais dinheiro obtido com impostos arrecadados. Jornalistas alemães descreveram Varoufakis recentemente como um psicótico que vive em mundo próprio, diferente do nosso. Mas será ele assim tão radical?

O que mais irrita em Varoufakis não é algum radicalismo, mas sua modéstia racional pragmática. Se se examinam de perto as propostas apresentadas pelo Syriza, é impossível não ver que foram um dia parte de uma agenda social-democrata moderada típica (na Suécia dos anos 1960s, o programa do governo era muito mais radical). É um triste sinal de nossos tempos que, hoje, você tenha de pertencer a uma esquerda dita “radical”, para poder reivindicar essas mesmas medidas. Sinal de tempos muito sinistros, mas também uma chance para que a esquerda ocupe o espaço que, há décadas, foi ocupado pelo centro-esquerda moderado.

Talvez, contudo, a infinita repetição de o quanto são modestas as políticas do Syriza, que não passariam da velha boa social-democracia, talvez deixe passar sem perceber o objetivo delas – como se, de tanto repetirmos o que somos, os eurocratas entendam que não somos perigosos e, afinal, nos ajudem.

Mas fato é que o Syriza é efetivamente perigoso: ele realmente ameaça a atual orientação da UE – o capitalismo global de hoje não suportará um retorno ao velho estado do bem-estar.

Portanto, há algo de hipócrita na repetição de o quanto são modestos os objetivos do Syriza. Porque o Syriza efetivamente deseja algo que é impossível dentro das coordenadas do sistema global existente.

Uma escolha estratégica séria terá de ser feita: e se tiver chegado o momento de deixar cair a máscara e passar a advogar abertamente uma mudança muito mais radical – necessária para garantir até um ganho bem modesto?

Muitos críticos do referendo grego disseram que era caso de pura demagogia, que não se via com clareza o que o referendo estaria votando. Com certeza, o referendo não mandava escolher entre euro e dracma, entre Grécia dentro ou Grécia fora da UE: o governo grego repetiu e enfatizou várias vezes seu desejo de permanecer na UE e na Eurozona. Mas como sempre e mais uma vez, os críticos automaticamente traduziram a questão política chave que o referendo levantou, para termos de decisão administrativa sobre específicas medidas econômicas.

* * *
Numa entrevista à Bloomberg, dia 2/7, Varoufakis deixou bem claros os termos do referendo. A escolha era entre continuação da política da UE dos últimos anos, que pôs a Grécia à beira da total ruína – a ficção de “ampliar e fingir” (ampliar o prazo para pagar dívidas e fingir que todas as dívidas serão algum dia pagas) – e outro recomeço realista, que não mais dependeria de ficções desse tipo, e geraria plano concreto sobre como iniciar a recuperação real da economia grega.

Sem tal plano, a crise só se reproduz, ela mesma, outra vez e outra vez e outra vez. No mesmo dia (2/7/2015), até o FMI admitiu que a Grécia precisa de alívio em grande escala da dívida, para criar “espaço para respirar” e fazer a economia andar (o FMI propôs moratória de 20 anos para o pagamento das dívidas).

O “Não” grego foi, portanto, muito mais que simples escolha entre dois diferentes modos de abordar a crise econômica. O povo grego resistiu heroicamente à desprezível campanha de medo que mobilizou até os mais baixos instintos de sobrevivência e autopreservação. Conseguiram ver através da manipulação brutal de que foram alvos, quando os inimigos do povo grego mentirosamente apresentaram o referendo como escolha entre o euro e o dracma, entre Grécia na Europa e “Grexit”.

O “Não” dos gregos foi “Não” aos eurocratas que diariamente provam que são incapazes de arrancar a Europa da própria inércia. Foi um “Não” à continuação da vida como sempre; um grito desesperado, a nos dizer que as coisas já não podem andar como sempre andaram. Foi uma decisão a favor de visão política autêntica, contra a estranha combinação de fria tecnocracia e quentes clichês racistas sobre os gregos preguiçosos, gastadores. Foi uma rara vitória de princípios contra o oportunismo egoísta e, de fato, autodestrutivo. O “Não” que venceu, foi um “Sim” à total consciência da crise na Europa; um “Sim” à necessidade de encenar um novo começo.

Agora, cabe à União Europeia agir. Conseguirá aquela gente acordar da inércia de autossatisfação, e compreender o sinal de esperança viva que o povo grego enviou ao mundo? Ou desencadeará sua ira perversa contra a Grécia, só para tentar continuar a sonhar seu velho sonho europeu dogmático?

Angola. PRENDAM-ME, EU TAMBÉM PENSO!



José Eduardo Agualusa – Rede Angola, opinião

A semana que passou talvez fique na História de Angola como o início do fim do longo reinado de José Eduardo dos Santos. Nas redes sociais, centenas de angolanos manifestaram-se contra a prisão dos jovens democratas. Artistas e intelectuais que até à data têm evitado manifestar a sua opinião, ou que sempre se posicionaram a favor do partido da situação, vieram a público dar conta da sua surpresa e da sua repulsa.

O discurso de José Eduardo dos Santos, afirmando que os jovens presos estariam a preparar um Golpe de Estado, e comparando o mesmo aos trágicos acontecimentos de 27 de Maio de 1977, veio dar força à ala mais reaccionária do MPLA, abrindo espaço para uma vaga repressiva e para um ciclo infindável de violência política. É um passo que não tem recuo. José Eduardo dos Santos teria de provar a tese do golpe de forma convincente, o que, como todos sabemos, não é possível. Ninguém em Angola acredita num tal disparate. Se os jovens forem libertados por ausência de provas, é o próprio presidente quem agora passará por aldrabão – além de ditador. Se não forem libertados irá dar-se início a um ciclo de protestos, prisões, mais e mais protestos, mais prisões e ainda mais protestos.

À instabilidade política criada pela irracionalidade do discurso presidencial soma-se a degradação da economia, e o consequente aprofundar do fosso social. Estamos, portanto, a caminho da tempestade perfeita.

A prisão dos jovens, e o discurso presidencial, constituem um verdadeiro separador de águas. A partir de agora já não se justifica o silêncio. Ou se está a favor da ditadura, ou se está do lado da paz, da democracia, da estabilidade e da justiça social.

Volto a ouvir o discurso do Presidente da República. Ouço depois as justificativas esfarrapadas e intelectualmente miseráveis de quem ainda o apoia, como o deputado João Pinto. Diz João Pinto que o facto dos jovens terem em sua posse uma lista de um futuro governo de unidade nacional é prova de que pretendiam derrubar o actual executivo. Há mais de trinta anos que me entretenho a imaginar a composição de eventuais governos democráticos. Eu e muitos amigos meus. Juntos e separados. Se fosse possível substituir governos dessa maneira, ou seja, imaginando governos melhores, José Eduardo dos Santos não teria sequer chegado à Presidência da República. João Pinto, coitado, nunca teria chegado a deputado. Infelizmente não é possível derrubar ditaduras por telepatia ou através de um esforço de imaginação, individual ou colectivo. Numa das minhas próximas crónicas apresentarei o meu governo de unidade nacional. Por ora quero apenas lançar um derradeiro apelo àqueles que, no interior do partido no poder, têm ainda um resto de dignidade, de amor a Angola, de inteligência e de senso do real: juntem-se e encontrem uma alternativa a José Eduardo dos Santos. José Eduardo dos Santos acabou. Chegou ao fim.

Devolvam-nos Angola!

Se for para continuar assim vão ter de prender muita gente. Um destes dias terão de me prender também a mim. Cometi todos os crimes de que Luaty e os seus companheiros são acusados. Cometi esses crimes ao lado deles. Quero uma Angola democrática, quero um governo preocupado em resolver as grandes injustiças sociais. Quero um governo preocupado em pacificar e não em dividir e criar o ódio.

Prendam-me! Eu também penso, logo, resisto!

Angola. DEPUTADOS DA UNITA VISITAM PRESOS POLÍTICOS EM LUANDA




Parlamentares querem confirmar as condições em que se encontram os 15 jovens detidos em Junho.

Deputados da UNITA visitam hoje os 15 jovens activistas detidos desde 20 de Junho por suspeita de rebelião contra o Estado, para tentar confirmar as condições em que se encontram.

A informação foi transmitida ontem à Lusa pelo presidente do grupo parlamentar da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), Raúl Danda, dando conta que a visita “está autorizada” pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e pela direcção dos Serviços Prisionais.

“Vamos visitar os 15 jovens nos três locais em que estão em detenção. Pretendemos saber, sobretudo, que estão bem, que estão a ser tratados em conformidade com a Constituição e com a lei, que não estão a ser torturados – porque temos ouvido alguns relatos – e que não estão a ver os seus direitos violados”, afirmou Raúl Danda.

O grupo de 15 jovens activistas foi detido porque estaria a preparar, segundo a PGR, em Luanda, um atentado contra o presidente e outros membros dos órgãos de soberania.

Estão detidos em regime de isolamento – dois deles iniciaram entretanto uma greve de fome – distribuídos por estabelecimentos prisionais em Viana, Calomboloca e Caquila, na região de Luanda, tendo os advogados apontado dificuldades em aceder aos mesmos e na apresentação de um recurso para pedir a libertação provisória.

O Ministério Público validou as detenções por a conduta dos suspeitos configurar actos preparatórios para o cometimento do crime de rebelião, tendo sido decretada a prisão preventiva “por inconveniência da liberdade provisória”.

“Queremos falar com eles para sabermos que estão bem e já recebemos a garantia do senhor procura-geral da República de que a lei será estritamente cumprida. Queremos assegurar que as palavras do senhor procurador, de quem não temos motivo nenhum para duvidar, estão de facto a corresponder com a situação real”, sublinhou o deputado Raúl Danda.

Numa abordagem a este caso, o presidente e líder do MPLA afirmou na quinta-feira que “não se deve permitir” que o povo “seja submetido a mais uma situação dramática como a que viveu em 27 de Maio de 1977″, aludindo à morte de milhares de pessoas numa tentativa de golpe de estado.

“Quem quer alcançar o cargo de Presidente da República e formar governo, que crie, se não tiver, o seu partido político, nos termos da Constituição e da Lei, e se candidate às eleições. Quem escolhe a via da força para tomar o poder ou usa meios para tal anticonstitucionais não é democrata. É tirano ou ditador”, acusou José Eduardo dos Santos.

“Acusaram o MPLA e os seus militantes de intolerantes, mas a mentira tem pernas curtas. Hoje sabe-se onde estão os intolerantes e nem é preciso dizer os seus nomes. Eles escondem-se atrás dos outros”, criticou.

Segundo a PGR, os detidos em prisão preventiva são Henrique Luati Beirão (conhecido como “Brigadeiro Mata Frakuzx”), Manuel Nito Alves, Afonso Matias “Mbanza-Hamza”, José Gomes Hata, Hitler Jessy Chivonde, Inocêncio António de Brito, Sedrick Domingos de Carvalho, Albano Evaristo Bingocabingo, Fernando António Tomás “Nicola”, Nélson Dibango Mendes dos Santos, Arante Kivuvu Lopes, Nuno Álvaro Dala, Benedito Jeremias, Domingos José da Cruz e Osvaldo Caholo (tenente das Forças Armadas Angolanas).

Na versão dos jovens activistas, associados ao designado Movimento Revolucionário, estes encontravam-se regularmente para discutir intervenção política e cívica, inclusive com acções de formação.

Foram detidos a 20 de Junho numa dessas reuniões.

Lusa, em Rede Angola – Na foto: Raúl Danda / Ampe Rogério/RA

Angola. INVESTIGAÇÃO E JUSTIÇA



Jornal de Angola, editorial

O combate à criminalidade é uma das mais importantes tarefas do Estado, que tem criado  mecanismos  adequados para se combater com eficiência os delinquentes que cometem  ilícitos criminais de diversa natureza.

Trata-se de uma tarefa permanente, pois não se podem dar tréguas aos criminosos que perturbam a paz social. O índice de criminalidade tem suscitado a preocupação das autoridades, que vão criando estruturas adequadas  à dimensão dos problemas que é preciso resolver, havendo  perspectivas de melhoria do trabalho da investigação criminal, um sector importante  que tem de atacar ilícitos como os crimes violentos, branqueamento de capitais,  tráfico de seres e órgãos humanos e imigração ilegal .

Espera-se naturalmente que as alterações estruturais que foram feitas ao nível investigação criminal venham a resultar numa redução efectiva dos índices de criminalidade no país,  devendo-se prestar atenção  à formação das pessoas que têm de se encarregar de tarefas  complexas  relacionadas com o combate ao crime. 

O ideal é que haja muita competência ao  nível da investigação criminal para se não violarem liberdades, direitos e garantias plasmados na Constituição e nas leis ordinárias. Os órgãos de investigação criminal devem também, no cumprimento das suas missões, lutar  pela defesa dessas liberdades, direitos e garantias.   

O ministro do Interior, Ângelo Tavares, disse recentemente, no Conselho Consultivo Alargado do  Serviço de Investigação Criminal (SIC) que se deve respeitar o princípio de investigar para prender e não o inverso. 

O ministro  pretendeu certamente, com estas  palavras,  pedir para que se trabalhe no sentido de se evitarem atropelos à lei e de os processos serem instruídos de forma correcta para haver julgamentos justos. 

As autoridades  têm a consciência que a criminalidade é um fenómeno complexo, pelo que  trataram de dotar os órgãos de investigação criminal de condições que os tornem mais eficientes em termos de operacionalidade para os crimes serem descobertos e os delinquentes detidos e entregues à justiça nos termos da lei . Já se percebeu que é necessário apostar na formação para que haja bons investigadores e uma boa instrução dos processos. Os que  se encarregam da investigação criminal devem observar  rigorosamente  o que a lei estabelece,  cumprindo sempre os procedimentos legais. 
Angola  é um Estado democrático de direito que promove e defende os direitos e liberdades fundamentais do homem.  

O  Serviço de Investigação Criminal tem grandes responsabilidades na luta contra a delinquência e há grande expectativa que este novo organismo venha a realizar um bom trabalho para garantir maior tranquilidade e segurança à nossa população. Eugénio Alexandre, director do Serviço de Investigação Criminal, que disse estar consciente das novas responsabilidades, garante que tudo vai ser feito  para  as missões que lhes forem incumbidas  serem cumpridas.

Que se tome entretanto boa nota do apelo do ministro Ângelo Tavares para que  haja  qualidade na instrução  processual. A justiça é dos  grandes valores prosseguidos pelo Estado e o SIC deve contribuir para  se evitarem injustiças .  O Serviço de Investigação Criminal deve estar também na primeira linha do combate  a injustiças, assegurando que os processos criminais, no âmbito das suas competências, em termos de instrução, decorram  sem lesões de direitos e garantias. Não é por acaso que o ministro do Interior  insiste  na formação de quadros, tendo  orientado o SIC a  elaborar programas de superação, na  perspectiva de se  melhorar constantemente   a instrução processual, o que, na opinião  de Ângelo Tavares,  pode  facilitar o trabalho dos demais operadores da Justiça. 

Entende-se que um bom trabalho do SIC, ao nível da instrução processual, pode conduzir  a resultados justos. Deve pois ser uma prioridade  a formação dos quadros do SIC , em particular os que estão ligados à instrução processual. A Justiça é um dos grandes pilares do nosso  Estado democrático de direito.  Prosseguir a justiça é  tarefa incontornável do Estado. Na sua actuação para a descoberta de crimes e detenção de criminosos devem-se  assumir condutas que se limitem  a resolver os problemas  dentro do que  a lei permite. 

As autoridades de investigação criminal devem ser exemplares no cumprimento das leis da República . A investigação criminal  deve cumprir as suas missões e consequentemente defender a população nos termos  da  Constituição e da lei. O respeito pela legalidade  é fundamental  para haver harmonia na sociedade e confiança nos nossos órgãos de justiça.

Que haja um amplo programa de formação e superação de quadros do SIC para que a nossa  Justiça melhore. Queremos todos que haja processos bem instruídos. O princípio de  investigar primeiro e prender depois a ser cumprido  vai  evitar  erros na instrução dos processos, salvaguardando-se a justiça.

CABO VERDE É UM SUCESSO. - E ENTÃO O REINO DO MPLA?




O primeiro-ministro português, Passos Coelho, considerou Cabo Verde um “caso ímpar de sucesso” em África, que conseguiu sucessivamente a independência, edificar o Estado, enraizar a democracia e aceder ao estatuto de país de Rendimento Médio.

Embora se trate de um elogio justo, torna-se perigoso. É que o regime de José Eduardo dos Santos não tolera que os portugueses sejam, para além de pobres, mal agradecidos. Isto porque, como bem sabe o governo português, Portugal está proibido de elogiar casos de sucesso sem, antes, esclarecer que o maior paradigma desse sucesso é Angola.

Pedro Passos Coelho falava na Cidade da Praia numa conferência de imprensa conjunta com o seu homólogo cabo-verdiano, José Maria Neves, após efectuar uma visita de cortesia no âmbito do convite para assistir às celebrações do 40º aniversário da independência de Cabo Verde, que hoje se celebra no arquipélago e na diáspora.

“Não há dúvida de que Cabo Verde é um caso ímpar de sucesso em África. Olhamos para Cabo Verde e vemos hoje um país com rendimento médio, com uma democracia constitucional pluralista enraizada, uma sociedade política respeitadora das liberdades fundamentais e que coloca no topo das preocupações o desenvolvimento sustentável de todo o território”, sublinhou Passos Coelho.

Ou seja, tudo o que Passos Coelho citou como prova do desenvolvimento de Cabo Verde não existe no reino de Eduardo dos Santos. Isso não significa, contudo, que Angola não seja o caso mais ímpar de sucesso em África.

Realçando o “grande respeito” pelo que Cabo Verde conseguiu em 40 anos de Estado soberano, Passos Coelho reforçou a “admiração” pelo facto de o país ser um arquipélago, destacando que tudo foi obtido sem a existência de recursos naturais.

“Mas creio que o resultado obtido nestes 40 anos nos merece não só respeito como admiração. Cabo Verde é, de facto, um caso único de sucesso em África, de um país que consegue elevar-se a país de rendimento médio e, ao mesmo tempo, dar resposta à satisfação de anseios tão importantes como aqueles que uma Nação tão jovem contém”, afirmou.

Destacando o relacionamento político bilateral actual “muito intenso”, o chefe do executivo português lembrou que a cooperação vem desde que o país acedeu à independência, a 5 de Julho de 1975, ao ponto de, hoje em dia, ambos se afirmarem como parceiros estratégicos do desenvolvimento.

No plano económico, realçou, há a “satisfação” relacionada com a intensidade das atuais relações e o “reconhecimento” da margem de progressão que se pode ainda registar em múltiplos sectores, como infra-estruturas, energia, ambiente, saúde, formação profissional, agronegócio, turismo, novas tecnologias e no domínio do Mar.

“Cabo Verde não pode deixar de ter uma relação íntima com o mar, tal como Portugal. Os próximos anos serão, do ponto de vista económico, muito relevantes no desenvolvimento de novos serviços e indústrias que irão explorar o potencial de forma mais intensa”, disse Passos Coelho, aludindo ao Cluster do Mar que o país está a desenvolver.

Por outro lado, o primeiro-ministro português destacou também a disponibilidade de Lisboa para reforçar a área da segurança marítima, que estão também a ser desenvolvidos em parceria com países africanos e com a União Europeia (UE).

“Há questões sobre a vizinhança a sul do Mediterrâneo, os problemas de segurança e terrorismo, e Cabo Verde tem também tido uma importante acção para responder aos desafios de segurança e de combate ao narcotráfico”, salientou, lembrando que estão a ser já lançadas as novas bases de cooperação para o triénio 2016/19.

Folha 8 (ao), 5.6.2015

Angola. DÓLARES ÀS… TONELADAS




O Governo angolano vai contratar um novo financiamento internacional, de 500 milhões de dólares, para projectos nos sectores da energia e das águas.

Odespacho presidencial, de 29 de Junho, aprova um acordo de financiamento com a Ecotech – Engineering & Technical Services, no valor de 125 milhões de dólares para “apoio orçamental ao Tesouro Nacional” e de mais 375 milhões de dólares “para fornecimento de materiais, produtos e execução de projectos”.

A autorização é justificada, lê-se no despacho assinado pelo Presidente José Eduardo dos Santos, com “a necessidade de garantir a implementação de projectos constantes do Programa de Investimentos Públicos” previstos no Orçamento Geral do Estado (OGE) de 2015 e face à “estratégia do executivo no que concerne à diversificação das fontes de financiamento”.

Face à quebra na cotação internacional do petróleo, o Governo angolano prevê um défice público de sete por cento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015. O ‘stock’ da dívida pública deverá elevar-se a 45,8% PIB do país, segundo a revisão do OGE, aprovada em Março passado.

O buraco nas contas públicas angolanas, devido à forte quebra das receitas petrolíferas, está avaliado em 806,5 mil milhões de kwanzas (cerca de seis mil milhões de euros), obrigando a novas necessidades de financiamento.

O Governo fechou nos últimos dias um empréstimo do Banco Mundial no valor de 450 milhões de dólares – acrescido de uma garantia de 200 milhões de dólares – e uma nova linha de apoio financeiro da China, esta última de valor não revelado.

Antes foram fechados acordos de financiamento com os franceses da Société Générale, no valor de 500 milhões de dólares, dos espanhóis do BBVA, de 500 milhões de euros, ou dos norte-americanos do Goldman Sachs e do fundo britânico Gemcorp Capital, cada um com 250 milhões de dólares, entre outros.

Com o mesmo argumento, Angola aprovou em Agosto de 2014 um financiamento de 1.500 milhões de dólares junto do banco russo VTB Capital PLC, conforme a Lusa noticiou na altura.

Já em Junho último somou-se um empréstimo de 123,7 milhões de dólares (110 milhões de euros), aprovado pelo Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), para financiar um projecto de abastecimento de água e saneamento básico em Angola.

Em Fevereiro foi fechado um acordo com o banco sul-africano Rand Merchant Bank (RMB), que vai financiar o projecto de construção e reabilitação de duas estradas nacionais angolanas (EN 180 e 225) com um empréstimo de 216 milhões de dólares.

Face à forte quebra na cotação internacional do petróleo, o Governo angolano reformulou várias previsões para 2015 e avança com um corte de um terço nas despesas totais.

O OGE revisto define que a previsão da cotação do barril de crude para exportação, necessária para a estimativa das receitas fiscais, desce de 81 para 40 dólares. Esta revisão fará reduzir o peso do petróleo nas receitas fiscais angolanas, de 70% em 2014 para 36,5% este ano.

Folha 8 (ao)

PASSOS COELHO 'DÁ' 40 MILHÕES DE EUROS Á GUINÉ-BISSAU




Portugal passa das palavras aos actos, com a visita oficial do primeiro-ministro português Pedro Passos Coelho a Bissau e que começou hoje.

Será através do PEC (2015/2020) que Portugal vai engajar os 40 milhões de euros prometidos na mesa redonda de Bruxelas, com enfoque nos sectores da defesa e segurança, justiça, administração pública, educação, emprego, saúde, protecção social, cultura, ambiente, energia, agricultura, pescas e desenvolvimento rural.

MB – Ditadura do Consenso (gb) - ontem

Guiné-Bissau. MORTE NA ESQUADRA LEVA PJ A DETER NOVE AGENTES POLICIAIS




Um cidadão nacional de nome Tchutcho Mendonça aproximadamente de 37 anos de idade foi encontrado morto hoje de manhã na cela da esquadra de polícia de Bissorã com sinais visíveis de tortura. Segundo informações recolhidas pela estrutura local da LGDH, o malogrado foi detido no passado dia 2 de Julho por alegados problemas com a sua própria família.

Respondendo a uma solicitação da LGDH, a Polícia Judiciária enviou de imediato para Bissorã uma equipa que incluiu um médico legal para apurar as circunstâncias da morte de Tchutcho. Devido à gravidade da situação a PJ resolveu transportar o corpo para Bissau para efeitos de observações mais aprofundadas, tendo procedido à detenção de 9 agentes da polícia de ordem pública daquele sector norte da Guiné-Bissau.

Uma delegação da LGDH dirigida pelo seu presidente vai visitar amanhã a morgue do Hospital Nacional Simão Mendes a partir das 8h 30 minutos para constatar in loco o estado do corpo da vítima.


MILITARES DA GUINÉ-BISSAU NÃO SÃO TIDOS NEM ACHADOS NA CRISE PR GOVERNO




OS POLÍTICOS QUEREM BAIXAR O PODER ÀS RUAS DE BISSAU?

No fecho desta edição, fontes bem colocadas falam da remodelação governamental proximamente.  Não se pode descartar essa hipótese tendo em conta que os rumores são quase «institucionalizados» no país, e, também, porque na maioria das vezes correspondem à verdade. Além disso, a ser verdade, o mínimo que se pode dizer é “até que enfim”. 

Todavia a ser verdade a primeira conclusão que se chega é que as partes desavindas podem já estar afinadas pelo mesmo diapasão depois das várias mediações feitas por personalidades nacionais e estrangeiras. A proposta de remodelação governamental terá sido apreciada e discutida “amigável e respeitosamente” antes de se chegar a qualquer conclusão.

Se, de facto, prevaleceu o bom senso em nome dos interesses superiores da Pátria, todos saem a ganhar porquanto a defesa e promoção da paz e estabilidade é tarefa de toda a sociedade. Que desta feita a responsabilidade da composição do elenco governamental seja partilhada pelas partes... No final da história não carece haver vencedor e vencido...

O Primeiro-Ministro pediu Moção de Confiança à Assembleia Nacional Popular duas vezes em menos de um ano. Em ambos os casos obteve o voto maioritário dos Deputados presentes na sessão.Quer dizer, que tem o suporte necessário e bastante para continuar à testa do Governo. 

A iniciativa de Domingos Simões Pereira não foi tomada de ânimo leve,  pelo contrário, terá sido fruto de um cálculo com conta peso e medida. Ao solicitar a ANP a aprovação de um voto de confiança ao Governo, Domingos Simões Pereira sabia de ciência certa que ia sair reforçado politicamente, pois a seu favor conta a coesão e solidariedade da maioria parlamentar que sustenta o seu Governo – PAIGC e PRS. Isso, depois de ter saído também reforçado da reunião do Comité Central onde não só pôs «KO» os seus adversários mas também, foram enviados recados assaz apimentados à Presidência da República para os fins convenientes.

Contudo, já não é segredo. A crispação política despoletada há meses está no auge. O Presidente da República e o Primeiro-Ministro estão de costas viradas e, numa determinada ocasião o presidente da ANP viu-se envolvido. A coabitação pacífica cuja prática tem sido defendida por muitos, e para a qual foram chamadas as partes reiteradas vezes a escolherem como opção, não foi conseguida. Os rumores e as intrigas ganham toada pelo país fora com todas as consequências a inerentes.

Na situação em que o país se encontra, ninguém é indiferente ao que se passa. Se se tiver em conta os resultados eleitorais expressivos de 2014, afirmar que os cidadãos não votaram para em menos de um ano viverem situação de crise institucional não será descabido. Não terá sido por acaso, que não houve grande dispersão de votos; nem terá sido por acaso, que os partidos da oposição, como que unanimemente, deixam andar o país ao “ritmo democrático” do vencedor das eleições gerais; nem sequer é por acaso que, contrariamente ao que se viu no passado recente, os militares não se têm manifestado nem esboçado qualquer gesto que possa ser interpretado como ingerência ou interferência em actos de governação. O choque é entre civis, entre políticos do mesmo Partido, eleitos para incrementar um projecto, um programa de governação cuja execução deve resultar em mudanças substanciais que conduzam o país rumo à paz, tranquilidade, progresso e desenvolvimento.  

Independentemente da filiação partidária ou simpatia político-partidária, com o fim da transição subsequente ao golpe de estado de 12 de Abril de 2012, a preocupação de todos é a preservação da paz e a estabilidade social e política na Guiné-Bissau. Todos consideram esse desiderato o bem maior porquanto dele depende as gerações actuais, o futuro do país e das gerações vindouras.

“Como eu disse, várias vezes, estamos a tratar de vários assuntos, que são sensíveis e são difíceis. Muitas vezes, a nossa posição não tem sido coincidente com a de sua Excelência, o Presidente da República”, esta afirmação do Primeiro-Ministro não encerra nada que vá contra os princípios democráticos aceites universalmente. É normal que em qualquer processo haja opiniões disjuntas relativamente a quaisquer ideias, projectos ou forma de conduzir qualquer processo. Isso é pacífico. O que não se compreende, em primeiro lugar, é a oclusão do acesso aos problemas reais que opõem o Primeiro-Ministro ao Presidente da República. Mais: não se entende, também, o porquê da insistência de parte a parte de que não há crise. É certo que durante os meses que transcorreram o Presidente da República tem sido parco em palavras e as suas observações têm sido inseridas em discursos circunstanciais.

Entretanto, os conselheiros é que têm estado a dar palpites, a fazerem observações alegadamente “em nome pessoal” mas com a clara intenção de manifestar “solidariedade ao chefe”, a sua posição, o seu entendimento, e a forma como se identifica no âmbito da crise. É óbvio que, nesta altura do campeonato, seria descabido que elemento qualquer das partes não defendesse as cores da camisola que o sustenta.

O Presidente JOMAV vai demitir o Governo ou não? O Primeiro-Ministro Domingos Simões Pereira vai propor uma remodelação governamental ou não? Em que ponto está a desavença entre JOMAV e DSP? Porque é que as duas personagens não se entendem? Será por falta de experiência política?

Estas são das questões  que atualmente estão no centro dos debates públicos na Guiné-Bissau e em todas as partes onde existem comunidades guineenses. Por sinal, uma parte pretende e faz tudo para implicar a comunidade internacional na resolução da crise despoletada, cujo desfecho se desconhece em absoluto, enquanto a outra parte quiçá serena e impávida, aguarda que caia a derradeira gota d’água que vai extravasar o copo.
Os sinais que apontamos desde Janeiro de 2015 como sendo reflexos do desaguisado entre o Presidente da República e o Primeiro-Ministro, hoje são por demais evidentes ao ponto de não deixarem qualquer dúvida sobre o que se seguirá nos próximos tempos no cenário político nacional.

Já não é mistério para ninguém que as duas figuras não se entendem não obstante a parte mais loquaz estar, insistentemente, a dizer, sempre que ocasião se oferece para tal, que a crispação vigente não se deve a questões pessoais… Quer dizer, o problema vem de outras origens que o grande público ainda desconhece. Mas, quais? Quem ganhará com isso?

As manobras que estão a ser feitas à volta do chamado, desprendidamente, “Governo de inclusão”, dá azo a vária leituras. Mas, sobretudo, provoca indignação por se tratar de manobras que, por não serem mais que pura propaganda, certamente, não levarão a qualquer lado de bom porque em certos casos atentam contra o bom nome de determinadas personalidades.  

Estão em curso exercícios de autêntica manipulação dos cidadãos, através de acções diversas com o objectivo claro de, em vez de procurar entendimento, mostrar as partes negativas, demonstrar que não ajuda o país numa altura em que, tendo em conta o sucesso da mesa redonda de Bruxelas, todas os cenários apontam que melhorias podem não tardar a chegar.

Para não incorrer em exagero, vamos simplesmente dizer que poucas vezes se viveu na Guiné-Bissau dias como os que correm, dias de relativa paz e tranquilidade. Há muito tempo, para não dizer nunca, se viu os militares tão ausentes do exercício do poder, afastados dos políticos e dos partidos políticos...

Efectivamente, o PAIGC, “PRS e companhia” têm condições de governar e de implementar o projecto polítco que conseguiu convencer o eleitorado a votar como votou.

Contudo, observadores atentos consideram que a inexperiência política dos titulares dos principais cargos é a responsável pela situação que se vive. 

Nada justifica o recurso ao Irã ou outros meios sobrenaturais para resolver diferenças de pontos de vista. Defendemos que deve haver respeito mútuo para que possa haver diálogo construtivo para se chegar ao entendimento sobre as grandes questões da vida nacional. 

No passado não muito distante, vimos o governo de Carlos Gomes Júnior ser demitido escassas horas depois da ANP ter aprovado uma expressiva moção de confiança. Portanto, a altura não é adequada ao uso de pressões que podem levar a adopção de medidas contraproducentes aos interesses nacionais.  O importante, de facto, é encontrar meios e formas de entendimento para superar as eventuais clivagens e a crispação política. E, não deixar o PODER desvirtuar-se e cair no descrédito. 

HAJABOM SENSO!

Ibrahim Haidara (Humberto Monteiro) – Gazeta de Notícias (gb)

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