Alberto Castro*, Londres
A
National Endowment For Democracy (NED), organização norte-americana sem fins
lucrativos criada para alegadamente reforçar instituições democráticas no
mundo, portanto, com fins declaradamente políticos, organizou na passada quinta
feira (18) um conferência subordinada ao tema “Perspectivas sobre a
Transparência, Direitos Humanos e Sociedade Civil em Angola”.
A
mesma, moderada pelo embaixador Princeton Lyman, membro do conselho executivo
da NED, teve como speakers o embaixador Todd Haskell, subsecretário adjunto
para os Assuntos Africanos do Departamento de Estado e conselheiro do
presidente dos EUA, o embaixador itinerante do governo angolano, António
Luvualu de Carvalho e o jornalista e ativista político, Rafael Marques.
O
evento foi na verdade um debate, para norte-americano ver e se deliciar, entre
dois angolanos que, apesar de separados por conhecidas, profundas e opostas
visões sobre o rumo atual e futuro da governação do país, conduziram suas falas
em clima de muita cordialidade, com sorrisos, palmadinhas nos ombros e apertos
de mão mesmo quando um deles, o autor de ''Diamantes de sangue", foi
repetidamente chamado de mentiroso pelo spin doctor e porta-voz
itinerante do azedado regime comandado pela Casa Dos Santos.
Rafael
Marques abriu as "hostilidades" e, na sua apresentação, citou
conhecidos casos de violação dos direitos humanos e de atropelos à democracia
por parte do repressivo aparelho de Estado e que ganharam notoriedade
internacional, nomeadamente o caso da seita do líder religioso Kalupeteka e o
dos jovens ativistas presos sob alegação de intentona de golpe de Estado e
formação de um novo governo que incluiria o próprio Marques.
Para
lá de conhecidas denúncias de práticas de má governação, neopatrimonialismo e
restrição de liberdade de imprensa, ele destacou o nepotismo reinante em Angola
e citou como exemplos Isabel e Filomeno, os príncipes mais notáveis da grande
Casa Dos Santos. À primeira, qualificou de "transparência de
pilhagem" os contratos a ela recentemente atribuídos para obras de reconstrução
da cidade de Luanda, da companhia petrolífera estatal Sonangol, assim como o
contrato para a construção da marginal sul da capital angolana. Ao segundo,
acusou de juventude e inexperiência para dirigir o Fundo Soberano de Angola,
organismo que gere "como se fosse um pátio de recreio”.
Por
seu turno, Luvualu de Carvalho, limitou-se a tomar nota do que o jornalista e
ativista dizia e, sem apresentar um "paper" próprio na sua
intervenção, fez da oportunidade mais um momento repleto de réplicas em defesa
intransigente da imagem do regime, papel de para que foi designado em setembro
de 2015.
Usando
dos mesmos argumentos com que já nos habituou em debates anteriores para
justificar a governança de que é agora porta-voz e zelador de imagem no plano
internacional - tarefa penosa, diga-se, porque não é fácil defender o
indefensável - Luvualo, jovem académico da nova geração da intelligentsia do
regime e que até tem bom poder de argumentação, tem de rever sua estratégia de
diplomata da imagem do poder de Luanda e da casa grande que o encabeça.
Enaltecer
os reconhecidos feitos do regime na capacitação humana, na recuperação de
infraestruturas do país e na manutenção da paz à nível regional, tudo isso em
tão curto espaço de tempo, é uma coisa. E muitos estaremos de acordo, mesmo
sabendo que, no que toca aos feitos internos, o regime não fez mais que o seu
dever. Entre outras, as questões a apresentar e responder seriam: Fez
bem? Poderia ter feito mais e melhor? Faz em benefício da maioria e de forma impessoal,
em igualdade de oportunidades para todos? Governa de forma inclusiva de modo a
encurtar a distância que separa os mais ricos dos mais pobres? Dialoga com as
oposições e respeita-as criando condições para que ela exponha sem
constrangimentos os seus programas e opiniões nas médias estatais?
As
respostas para a quase totalidade destas questões, por mais que a retórica de
Luvualo diga que sim, são negadas pela realidade. Mas o pior no jovem
académico, spin doctor da imagem do regime, é tentar justificar práticas
de má governação nepóstica e neopatrimonialista com ilustrações, algumas
péssimas, de países do rico e democrático norte, como o fez tomando como
exemplo o caso do filho do pouco recomendável Nicolas Sarkozy, o qual o
ex-presidente francês tentou que fosse nomeado para um cargo público com apenas
23 anos, para fazer um paralelo com o que se passa na Casa Grande dos Dos
Santos.
Inteligente
como aparenta ser, o embaixador Itinerante sabe, como diria Obama, que está do
lado errado da história. E, como ele, muitos que não tendo, ou não querendo
ter, outra opção senão a de defender a qualquer preço um regime fora de prazo,
se ridicularizam na cúmplice intransigência ruidosa das suas retóricas.
Em
suma, a conferência não acrescentou nada de novo para além do mais do mesmo de
um lado e do outro, com um subsecretário adjunto conciliador e, como bom
diplomata, a dar uma no cravo e outra na ferradura. Por um lado, a destacar a
importância de Angola que, a par da Nigéria e da África do Sul, é um dos três parceiros
estratégicos dos EUA no continente, com importantes relações comerciais e
parcerias na manutenção da paz e segurança global. Por outro, a frisar as
diferenças no tocante a temas como democracia e direitos humanos, salientando,
no entanto, que ambos lados tentam aprender um com o outro com diálogo.
*Alberto Castro é correspondente de Afropress em
Londres e colabora em Página Global
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