sexta-feira, 16 de março de 2018

PORTUGAL DOS MENTIROSOS | A “imagem desgraçada” do secretário-geral do PSD


A fabulosa vida de estudante de Barreiras Duarte

Secretário-geral do PSD pediu parecer por eventual incompatibilidade com Berkeley e bolsas em 2008, apesar de nunca lá ter ido.

Feliciano Barreiras Duarte, secretário-geral do PSD de Rui Rio, pediu em 2008 um parecer sobre uma eventual incompatibilidade de um doutoramento em Berkeley e receber duas bolsas, enquanto deputado na Assembleia da República.

Segundo dados recolhidos pela SÁBADO, além da universidade norte-americana, Barreiras Duarte pretenderia receber outra bolsa, mas desta vez da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD), algo que a própria instituição relata que nunca chegou a acontecer. No Parlamento, o pedido de Barreiras Duarte chegou a ser apreciado e teve a seguinte resposta: "Não existe qualquer incompatibilidade ou impedimento no exercício cumulativo (…) de mandato de Deputado com a frequência de doutoramento em universidade pública estrangeira (…) e com o recebimento, no âmbito desse doutoramento, de bolsas para investigação". O parecer pedido por Barreiras Duarte foi elaborado pelo deputado relator Agostinho Branquinho e assinado pela vice-presidente da Comissão de Ética, Teresa Portugal, a 9 de Julho de 2008.

Dez anos depois, Teresa Portugal lamenta a polémica com Barreiras Duarte. "Um deputado que se candidata ao Parlamento tem que ter um código de ética tão profundo e sério que ninguém possa pôr em causa uma declaração que faça", salienta a antiga deputada socialista. "Dentro da minha cabeça não cabia a hipótese de que ele estivesse a mentir. Dá uma imagem desgraçada da pessoa e da política, que tem que ser uma escola de si própria."

Certo é que o parecer da Assembleia até foi traduzido em inglês, com vista à entrega na Universidade de Berkeley.

À SÁBADO, a FLAD garantiu que Barreiras Duarte "nunca beneficiou de qualquer apoio, a título de bolsa ou de subsídio, desta Fundação", nem "existem quaisquer outros registos de colaboração". Barreiras Duarte nunca pediu, sequer, qualquer bolsa ou subsídio para efeitos de investigação à Fundação.

Inquirido, o secretário-geral do PSD remeteu explicações para o seu consultor de comunicação, António José Laranjeira. "Barreiras Duarte nunca concorreu a bolsas. Nunca contactou com a FLAD para conseguir uma. Entendeu pedir um parecer à Comissão de Ética com antecedência para saber se teria essa possibilidade", explicou Laranjeira. Confrontado com mais questões sobre o currículo de Barreiras Duarte, o consultor indicou que responderia por email esta manhã – o que não se concretizou.

No seu currículo académico, Barreiras Duarte frisa que foi professor auxiliar convidado e membro do Conselho Científico da Universidade Lusófona, bem como deputado e consultor. Quando entregou o parecer acerca de possíveis incompatibilidades aos seus colegas deputados, Barreiras Duarte ainda não se tinha inscrito no doutoramento: tal ocorreu junto da Universidade Autónoma só em Novembro de 2015.

Contudo, no relatório profissional que lhe valeu o grau de mestre, indicava em 2014 que o estava a "concluir", em parceria com a Universidade de Berkeley, desde duas datas: 2008, e 2009. Questionado, Barreiras Duarte não esclareceu estas informações. Entre a instituição norte-americana e a Autónoma não existe qualquer acordo.

Júri de mestrado elogiou "percurso profissional" de Barreiras Duarte

No dia 31 de Outubro de 2014, Feliciano Barreiras Duarte defendeu o relatório de actividade profissional que lhe conferiu o mestrado em Direito, na especialidade de Ciências Político-Jurídicas. O júri, composto por Constança Urbano de Sousa (antiga ministra da Administração Interna), António Carlos dos Santos e Diogo Leite de Campos, deu-lhe 18 valores, por unanimidade.

A actividade profissional de Barreiras Duarte foi muito elogiada pelos professores. Constança Urbano de Sousa, presidente do júri das provas, justificou os 18 valores dados "pelo percurso profissional, provas públicas e trabalho apresentado".

Já António Carlos dos Santos indicou que a nota de excelente por ele também assinalada foi dada "em função da defesa de dissertação (CV + estudo) mais do que o trabalho apresentado". No entanto, ao Observador, o professor indicara que se cingira "a avaliar o conteúdo da tese. E, do pouco que me recordo, queria dar uma nota inferior àquela que ele teve. Mas os meus colegas jurados preferiram dar uma nota superior".

Leite de Campos, orientador de Duarte e antigo vice-presidente do PSD, elogiou "o trabalho apresentado e o curriculum vitae de muito bom nível, demonstrando alta preparação e capacidade". Também ao Observador, tinha lamentado a polémica sobre as alegações do aluno: "Como é que pode dizer uma coisa se não é verdade? Não fico desconfiado dele, mas estou convencido que terá muito mais cuidado daqui para frente."

Todos os professores escolheram dar 18 valores a Feliciano Barreiras Duarte.

Na conclusão do relatório profissional avaliado, o secretário-geral do PSD escreve: "Em conclusão, a elaboração deste relatório, com os fins e objectivos anteriormente referidos, pretende-se que seja consabido, o relacionamento entre a primeira e a segunda parte do mesmo, com a evidência principal, que de entre a multiplicidade do currículo do seu autor, poderá sobressair e outrossim destacar, o fio condutor de que nas suas múltiplas actividades e intervenções, académicas, profissionais, não profissionais, mas de servidor público, jurista, professor, investigador, conferencista, autor e afins, está sempre presente uma trave mestra – a saber – que é a problemática do sistema jurídico e político português. Com uma incidência especial, na sua axiologia, a sua catalogação jurídico política e sobretudo a sua elasticidade jurídico constitucional. De entre outros temas possíveis e prováveis de serem expendidos pelo autor, a problemática associada a este tema, tem toda a actualidade para quem, tem 21 livros publicados, prefaciou vários trabalhos de investigação, foi conferencista e moderador em 164 conferencias [sic], seminários e afins, publicou cerca de 750 artigos e cronicas [sic] em jornais e revistas, e tem variadas intervenções no plano profissional, extraprofissional, publica [sic], política e de outras tipologias."

Universidade Autónoma decide se Feliciano deve ter aulas 

O Conselho Científico da Universidade Autónoma de Lisboa (UAL) vai decidir, no dia 20 de Março, se Feliciano Barreiras Duarte tem de frequentar as aulas de doutoramento. O estatuto de visiting scholar, já desmentido pela Universidade de Berkeley, foi importante para a dispensa da parte escolar, considera a UAL. Face à polémica sobre a falsa passagem de Duarte pela universidade norte-americana, o caso será analisado.

Caso o Conselho decida que a dispensa das aulas se baseou em grande parte no estatuto de visiting scholar, o secretário-geral do PSD será convidado a frequentar a parte lectiva. Caso não o faça, tem de abandonar o doutoramento.

Para ser dispensado da parte escolar, o antigo deputado social-democrata justificou que tinha pelo menos cinco anos de comprovada experiência profissional. Além de afirmar que era visiting scholar, Duarte alegou que era professor universitário, deputado, e consultor, entre outras actividades profissionais.

Barreiras Duarte está inscrito no doutoramento junto da Universidade Autónoma de Lisboa desde Novembro de 2015. Pediu uma prorrogação que aumenta o limite para ter de prestar provas até 31 de Maio. 

Leonor Riso | Sábado

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